domingo, 13 de outubro de 2013

O papagaio do padre

Na cidade de Patos, na Paraíba, o padre de algumas décadas atrás, além de muito afetuoso e afeiçoado às pessoas, gostava muito de animais e, aos poucos, acabou transformou sua residência num mini-zoológico. Criava patos, perus, galinhas de diversas raças, galinhas de angola, gatos, cachorros, canários belgas, coelhos, porquinhos da Índia, e, o que não podia faltar, no meio desta diversidade, uma dupla de papagaios matreiros. Todos estes animais viviam soltos e todos tinham acesso livre ao interior da residência paroquial. Evidentemente não poderia a casa estar limpa e asseada, mas padre Nicolau se ajeitava nesta parafernália de gritos, brigas, chilreados, latidos, miados e sabe Deus quanta outra combinação ruidosa. Nem sempre a conversa com visitantes era audível devido aos constantes desencontros no meio da bicharada. Embora algumas pessoas já tivessem sugerido ao padre para que procurasse outro ambiente mais adequado para esta multiplicidade animalesca, o padre achava bom permanecer ali mesmo com sua variegada companhia. Um dia padre Nicolau foi surpreendido por uma admoestação muito séria advinda de seu superior, o Bispo. Ao fazer uma visita de rotina ao padre Nicolau, o bispo, vestido de modo impecável e com procedimentos aparentemente muito pios e escrupulosos, viu com muita simpatia os dois papagaios, sentados num varal próximo ao fogão da cozinha. Aproximou-se dos papagaios, e, como muita gente faz, tentou entabular uma pequena conversa com os papagaios: Oh! Loro, lorinho, verdinho e bonitinho, dá o pezinho Loro! A resposta de um dos papagaios foi imediata: - Só se me dá o ... (aquele palavrão chulo, que não deve ser usado na conversa e na escrita, mas que é muito usado a toda hora, cuja denominação implica na junção da consoante “c” com a vogal “u”, ou seja, o espaço do corpo humano onde o reto estabelece contato com o mundo exterior). O bispo não falou uma palavra sequer, mas, ficou vermelho como a cabeça de um dos perus que se encontravam ao lado, e se retirou imediatamente da cozinha para ir à procura do padre Nicolau a fim de censurá-lo pela forma inadequada de amestrar os papagaios, pois jamais um padre poderia ensinar algo tão vil e tão deplorável a inocentes papagaios. Se fosse algum outro cidadão a proceder de forma tão devassa, ainda se poderia tolerar o disparate, mas, um padre ensinar coisa feia desta natureza a um papagaio, significava um procedimento altamente reprovável para a sua função. Embora de tez morena, o padre Nicolau também ficou mais ruborizado do que de costume, pois, apesar da satisfação e da estupefação sentida na bela resposta do papagaio a um homem excessivamente escrupuloso, precisava, contudo, fazer sua defesa e justificar-se que não tinha sequer pensado em nada próximo de tal perversidade para os momentos de docência junto aos verdes tagarelas. Jurou diante do bispo que jamais ensinou os papagaios a emitirem tal resposta. Nas ponderações, ficou mais ou menos evidente que a empregada do padre deveria ter sido a fautora da escabrosa ação pedagógica junto aos papagaios. Padre Nicolau, apesar do desconforto, vibrou por dentro, pois, achava que o bispo realmente precisaria ouvir algo um pouco mais xistoso a fim de se tornar um pouco mais tolerante nos seus parâmetros de beatitude e alargar o limiar excessivamente estreito de tudo quanto enquadra no campo do chifrudo. Dali para frente, o padre, descobriu que o xingamento do bispo, na verdade, o despertou para a originalidade da resposta do papagaio e transformou esta brincadeira em agradável forma de recepção das pessoas. Assim que alguma pessoa visitante viesse a dar-se conta da existência dos papagaios dentro de casa, padre Nicolau lhe sugeria ir ao encontro dos papagaios e pedir o pezinho. A resposta vinha de imediato e continuava infalivelmente sempre a mesma. Assim, os papagaios podiam ofender a inadvertidos, mas não brigavam com ninguém.

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