sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Arrogância



Já que não existem pílulas específicas,
Nem específico que anule a arrogância,
Como encontrar em caminhos pacíficos,
Um lenitivo reagente à preponderância,
De pessoas que em nada são magníficas?

Tanto sonho de companheirismo e respeito,
Esvai-se desiludido por dissensões causadas,
Pela prepotência a alargar tanto contrafeito,
E que não aponta um caminho mais decente,
Para as incontáveis vítimas sem básica defesa.

Algum ambiente social engendrou os traços,
Que levam multidões a sofrer desamparadas,
E as leis, sempre favoráveis aos prepotentes,
Em nada ajudam a aliviar opressões execradas,
Para elevar a respeitoso trato os descontentes.

Adiantaria sugerir o esvaziamento do orgulho,
Que causa vítimas feridas no âmago da vida,
E favorecer seu companheirismo de murmulho,
Dos espontâneos cachinados da cotidiana lida,
A enriquecer seus belos atos de convivência?







quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Nos difíceis rumos da vida



            Nossa condição de seres humanos, mesmo com alguma superioridade técnica, cultural e social sobre os demais seres existentes na terra, - por mais que alcança e  consegue conquistar, - não nos livra da dura tarefa de refazer e de reconstruir o fio do sentido da existência.
            Em muitas e seguidas ocasiões este “fio da meada” é obstruído por decepções profundas; em outras, por medos e ameaças diante do que projetamos como o melhor para o futuro; em outras, ainda, por descrer na própria capacidade de lidar com adversidades cotidianas, de recomeçar diante de perdas e de integrar mágoas, raivas e tantos outros sentimentos que tiram o humor positivo da vida.
            Para pessoas de fé sempre resta o consolo do que Deus possa ajudar na lida para a superação das dificuldades. Entretanto, como perceber a ação e as interpelações de Deus? Basta ficar passivo, e, esperar que ele nos faça felizes e satisfeitos?
            Dos ensinamentos de Jesus Cristo podemos perceber que ele não orientava nem para o fatalismo das desgraças e nem para mágicas divinas capazes de suprir as limitações humanas. Orientava para a mudança de atitudes e, para a busca do melhor caminho do que Deus interpelava, estava uma condição: a da justiça.
            Bem sabemos que a redenção, a salvação e a progressividade no sentido existencial da vida não provêm da mera conquista pessoal. Jesus deu a entender que se trata de um dom de Deus que precisa ser perscrutado. Este dom não equivale a uma ação mágica capaz de livrar-nos de quaisquer sofrimentos, mas é, eminentemente, a capacidade de mudar, de adaptar-se a situações novas e de recomeçar, sempre de novo e muitas vezes, diante de perdas e fracassos.
            Jesus usou a imagem de uma pequena historinha para fazer seus discípulos entender este necessário dinamismo da vida (Mt 21,28-32). Mostrou que inclusive a segurança das coisas estáveis, imutáveis e certas, como tantos cristãos querem insinuar com piedades e rituais exteriores, não constituem certamente o melhor caminho, porque levam as pessoas a se fecharem diante da graça de mudar, e, porque as torna soberbas, dominadoras e obcecadas em torno de certas exterioridades piedosas que as enganam.
            O caminho que Deus deve estar esperando para a nossa vida, com certeza, não pode ser o do rigorismo de alguns atos, rituais e modos formalistas de rezar, pois, precisamente estes tornam difícil a convivência e truncam os relacionamentos com as outras pessoas.
            O humilde itinerário é o de nos tornar capazes de inverter os muitos “nãos” que dizemos e pensamos, para lentos e sofridos “sins” efetivos, de pequenos gestos e atos, capazes de mudar nosso humor e o entorno da convivência.



            

Procedimentos perversos



Todo o desvelo para gestação da vida,
E o entorno da emoção para vicejá-la,
Representam pouco na cotidiana lida,
Para envolvê-la de afeto e aprimorá-la.

Nas marcas indeléveis da socialização,
Engendram-se perfis de personalidade,
Tão distantes da boa e renomada ação,
Que ferem o senso de uma sociedade.

Ao avesso do bem-estar da coletividade,
Sugam à exaustão todo direito coletivo,
E longe dos parâmetros da honestidade,
Justificam-se como único e bom lenitivo.

O termo “justo” entendido sob novo legado,
Ignora do coletivo, todas as barreiras e eiras,
E dele se apropria como se fosse algo privado,
Para perversos desfrutes, livres de fronteiras.

Injustos são os insubordinados ao seu poder,
Que espoliados do que rendem e produzem,
Tateiam e ficam todos os dias a se escafeder,
E, seus direitos, em nada, para algo reluzem.

Resta esperar do bom-senso o embargo,
De colocar uma condição à governança,
De pagar mais que recebe pelo encargo,
Sem mordomias e sem qualquer fiança.




quinta-feira, 18 de setembro de 2014

Espiritualidade



Vaga no significado,
E evasiva no legado,
Expressa um ensejo,
De profundo desejo.

Não nega o material,
Já que arrosta o real,
E enleva todo finito,
Com seu contradito.

É entrega ao inefável,
Da comunhão amável,
Do meio circundante,
E da beleza diletante.

Não é espiritualismo,
Tampouco espiritismo,
Mas neles está o dom,
De um itinerário bom.

No caminho ascético,
Ao avesso do eclético,
Seu olhar apaixonado,
Capta humano legado.

Nem fuga do humano,
Ou do seu desengano,
Contempla todo real,
E lhe aponta luz vital.




quarta-feira, 17 de setembro de 2014

A meritocracia das recompensas



            Desde muito cedo somos induzidos, pelos ambientes sociais do nosso entorno, a pressupor que tudo possa ser negociável: qualquer feito, serviço, ou gesto, deve corresponder a um poder de barganha com vistas a obter algum benefício ou alguma vantagem. Até mesmo nas relações afetivas do ambiente doméstico, o jogo implica em expectativas de recompensa por qualquer préstimo ou favor que venha a ser feito.
            Este cotidiano do “tudo comercializável” facilmente interfere nos modos de vivência na comunidade cristã. Assim, qualquer ajuda ou colaboração em favor da comunidade implica em alguma perspectiva de retorno. Para muitos, até mesmo a exposição mais notável em celebrações os leva a esperar recompensa, se não de elogios e benemerências, pelo menos, muitos votos para cargos políticos.
            Como o dia-a-dia é de comercialização, não custa passar ao atributo de que Deus esteja envolvido no mesmo jogo. Suplica-se, pede-se, implora-se, mas sempre em favor de uma intercessão, vista como merecida. E ai de Deus se não for muito rápido na concessão do que lhe fora pedido! E quanta conversa de gente a se lamentar contra a ineficiência de Deus!
            Numa historinha contada por Jesus transparece o jeito de Deus totalmente distinto no modo de agir (Mt 20,1-16): os contratados para trabalhar na vinha foram recebendo o salário combinado, e, mesmo os últimos, que trabalharam apenas um pouquinho, receberam pagamento similar ao daqueles que foram pagos por terem trabalhado muitas horas antes, e, a mais.
            A meritocracia presente nas comunidades em torno dos eventuais serviços em favor do bem comum chega a ser notável em nossos dias. Em primeiro lugar, já são muito reduzidos os membros de uma comunidade que ainda se dispõem a efetuar algum serviço gratuito. E quando o aceitam, geralmente, por curto espaço de tempo, costumam declarar com um ar de superioridade moral: eu fiz minha parte! Agora é a vez de outros também mostrarem gratuidade e suar um pouco pela comunidade.
            A historinha contada por Jesus Cristo certamente visava membros do seu discipulado, que gestaram as comunidades cristãs, porque já manifestavam traços desta conduta de espera de retribuição por eventuais ações em favor do bem comum. Parece que Jesus Cristo lhes deu a entender que se deve trabalhar sempre, e por puro dom numa comunidade. Assim, os novos membros que a ela se agregam, mesmo tendo feito pouco ou nada, são levados em conta por Deus da mesma forma como são levados em conta os que já atuam há muitos anos ou décadas.
            Por conseguinte, os méritos de quaisquer atos ou gestos em favor da comunidade não devem visar recompensas e nem mesmo a espera de especiais vantagens da parte de Deus. Devem ser feitos, por gratuidade, como resposta ao amor de Deus.

            

terça-feira, 16 de setembro de 2014

A cruz da tortura



Milenar tática humana,
De intimidar as pessoas,
Mesmo de índoles boas,
A tanta gente desengana.

Usada como instrumento,
Da execrada humilhação,
A cruz, sinal de tormento,
Virou símbolo de maldição.

Para a romana prepotência,
A crucificação de insurgente,
Constituía clara advertência,
Para a submissão obediente.

Se a tortura levava horas a dias,
Para o corpo esquálido perecer,
Ainda negava aos amigos as vias,
De tirá-lo e dele se compadecer.

Obrigado a se decompor sem eira,
Indicava caminho similar a ousados,
Que quisessem de alguma maneira,
Subverter a ordem dos renomados.
No modo de Cristo ser crucificado,
Abriu-se, ao mundo, novo legado,
Da compaixão que venceu o ódio,
E elevou a vida a um novo pódio.

Se o ícone da cruz indica o novo,
Do agir com respeito a todo povo,
Escancara, todavia, grave agressão,
Da morte lenta por procrastinação.

Já não mais pendentes sob o lenho,
Inumeráveis seres vagueiam ao léu,
Num clamor por justiça ao alto céu,
Por mais humanitário desempenho.





sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Plenitude de vida



Se os desejos se abrem ao infinito,
Libertos das barreiras dos limites,
Padecem, entretanto, do não dito,
De anônimos e traiçoeiros palpites.

Culturalmente devorados pela insinuação,
Propiciam uma falsa sensação de liberdade,
Que esconde toda a má e perversa maldade,
De atrelamento ao poder de procrastinação.

Movidos a possuir e a consumir a fartura,
Da indústria cultural feita inédita loucura,
São os desejos canalizados à voracidade,
De manipulação sem limites na maldade.

A nova cruz que tortura e leva à morte,
Exaure na agonia lenta dos muitos dias,
Uma dor desnudada que indica a sorte,
Do sentido ferido por múltiplas tiranias.

Os simulacros em torno do auge do amor,
Exploram escancaradamente os desfrutes,
Que “coisificam” similares sem pundonor,
Fazendo-os passar como gostosos quitutes.

Na re-significação dada por Cristo à cruz,
Delineou-se caminho oposto ao império,
E que ainda hoje leva a vislumbrar a luz,
Duma convivência sem tanto impropério.





quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Vacilações na fé



            A noção de bondade humana encontra, seguidamente, percalços de atos violentos e, capazes de apavorar. Há pessoas bem traumatizadas por pavores assimilados em tempestades. Outras de apavoram diante de sapos, de baratas, de camundongos e até de pequenos animais altamente inofensivos, porquanto a socialização infantil lhes incutiu este pavor.
            Mesmo desejando intensamente uma vida de convivência agradável, pacífica e ordeira, não conseguimos isentar-nos de seguidos momentos de conflitos e desapontamentos, capazes de nos induzir à prostração.
            Muitos dos nossos sofrimentos decorrem de excessiva auto-confiança, parecida com a de Pedro em tempestade na noite escura. Parece que lhe faltou a capacidade de oração para lidar com as dificuldades.
            No Evangelho de Mateus (14,23-33) encontramos uma descrição de um episódio, aparentemente mágico, mas que, sob um aspecto alegórico, é muito claro e elucidativo para remeter a uma constatação importante: enquanto Pedro se afundava na tempestade, Jesus estava rezando e, depois, passou a caminhar sobre as águas!
            Mais do que um episódio de uma noite escura e difícil no mar da Galiléia, a abordagem de Mateus parece remeter para questões mais significativas do âmbito da fé: se nós vivemos mergulhados em seguidos temporais de medo, de pavor e de confusão nos tormentos das noites escuras em que a consciência revira e agita mil sentimentos de insegurança, poderia a capacidade de rezar – como aconteceu com Jesus Cristo, levar-nos a procedimentos bem mais serenos e calmos. Andando sobre as águas, ele acalma a tempestade!
Na mensagem parece estar presente um indicativo do porque Pedro ia se afundando nas águas, e, também do porque nós muitas vezes nos damos mal em nossas remadas ou decisões em meio a tempestades mentais de noites escuras.
A interpelação também pode remeter a uma avaliação do desmantelamento de muitas lidas, pastorais e movimentos, no interior da Igreja: não estariam muito legalistas, exteriorizadas, formalistas e fundamentalistas em evidente processo de afundamento? Pode estar faltando o imprescindível para poder andar sobre as águas destas ondas apavorantes: será que Cristo não está interpelando a respeito de algo que deverá acontecer acima destes problemas de previsões nada animadoras e que levam a sucumbir no caminho da fé?
Que o procedimento de Pedro, nos indique um itinerário capaz de trazer calmaria, a fim de que, os modernos Leviatãs dos mares, não se tornem monstros capazes de afundar os que remam desesperadamente e, mesmo assim, não saem da tempestade. Possivelmente teremos que aprender outro jeito de rezar!


quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Midiatização da Religião



Momentos hierofânicos,
Tão experimentáveis,
Em distintos lugares,
Nem tão satânicos,
De denodados ares,
Geram climas inefáveis.

Emergem da mídia,
Feita instrumento,
Forças de alento,
Do Cristo Senhor,
De renovado ardor.

Alteram a mediação,
Da histórica difusão,
Incumbida ao padre,
E deslocam todo afã,
Da simbologia cristã.

O fiel deixa o templo,
E busca sinais divinos,
Nos serviços off-line,
Das redes de domínio,
Onde encontra fascínio.

A nova forma do sagrado,
Remete ao transcendente,
E, em qualquer situação,
De jeito muito diferente,
Emancipa-se da tradição.

Nos signos e nos dígitos,
Emerge novo mediador,
Dos sinais teofânicos,
Que, mesmo ufânicos,
Clareiam vasto pendor.

Resta esperar da novidade,
A condição da humanidade,
Desatrelar o Deus da venda,
Como novo objeto de renda,

E de consumismo à saciedade.

quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Quando o coração se fecha



            Bem sabemos que a comparação alegórica do “coração fechado” não se refere ao órgão propulsor do sangue, mas a um modo afetivo de se relacionar com familiares e demais pessoas da convivência. São muito variados os fatos que levam alguém a sentir mágoas diante de certas pessoas: podem ser agressões verbais, gestos de desconsideração, modos de ser e de conversar, e, especialmente, os modos dos “não ditos”, ou seja, silêncios, olhares ou desvio de olhares. Estes costumam ferir mais o âmago dos sentimentos do que ofensas verbais.
            Na sutileza destas pequenas coisas nascem sentimentos de perda e de mágoa, capazes de romper a comunhão, quer com pais, irmãos ou outras pessoas. Mesmo sem maior gravidade de fatos, muitas pequenas decepções podem levar a uma autodefesa que pode ser identificada e comparada ao “coração fechado”.
            Dos Evangelhos sabemos que Jesus Cristo teve que lidar com muita gente magoada, ressentida, e, com rancor devido a dissonâncias na convivência. No Evangelho do Mateus, capítulo 18, versículos quinze a vinte, por exemplo, mostra-se que Jesus deu uma orientação importante às comunidades: o caminho do diálogo é muito melhor e muito mais eficaz do que ficar acumulando raivas decorrentes de desencontros ou de idéias ou de sentimentos.
            A tentação natural de reação, quando nos sentimos vítimas de variadas formas interpretadas como agressivas, é a de romper a conversa e a comunhão com estas pessoas. Bem sabemos que tal procedimento não resolve nada para superar o desencontro. Jesus indicou uma tarefa que, em primeiro lugar, exige humildade: conversar. Se não dá sozinho, sugeriu levar alguém para mediar o entendimento e, se assim mesmo nada resolver, que se proceda pedido ajuda à comunidade.

            Em nossos dias as comunidades passam por dificuldades de agregação, mas, mesmo assim, estão imbuídas de importante papel mediador para que seus membros se entendam e se respeitem. Elas também estão encarregadas de reaproximar quem dela se afastou. Tal responsabilidade precisa ser cultivada e coloca os membros de uma comunidade na missão de levar mais pessoas a integrar-se num projeto de comunhão. No caminho do discipulado de Cristo, o importante é ir e agir e não ficar  encalusurado em si mesmo.

segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Saudades



Sua longa história,
De superações geniais,
Despertam do âmago da memória,
Seus gestos, seus gostos e seus atos especiais.

Se a dor da separação entristece,
A recordação da sua vida muito enaltece,
A quem soube sugar e desfrutar da especial riqueza,
Da sua benfazeja forma de servir e amar com rara inteireza.

No dom da sua existência,
Desabrochado com rara benemerência,
Está a vida ampliada de filhos, netos e bisnetos,
Que não cansam de relembrar seus atos concretos.

Quão bom é lembrar,
A grandiosidade da sua vida,
Tão impregnada de singeleza na lida,
E tão pródiga na capacidade de ser auto-aprimorar.

Que os frutos da sua auto-transcendência,
Possam gestar forças de renovada competência,
Nos que foram agraciados pelo dom da sua história,
E elevam o humor da sua vida a partir da sua rica memória.



Morte



Não desejada e nem esperada,
Mesmo ao aparecer evidente,
Feriu o âmago de quem sente,
A evidência, como inesperada.

Se por um lado aviva a grandeza,
Da vida, vivida com rica presteza,
Desperta por outro a contradição,
Da linguagem sem nenhuma ação.

Na expectativa da transcendência,
E da escatológica benemerência,
Resta esperar do rol da plenitude,
A valorização da diuturna virtude.

Nos enternecidos fala a rica memória,
De longa vida sem nenhuma vanglória,
Mas que na simplicidade tão atenciosa,
Soube mostrar-se altamente prestimosa.

Na esperança de que o grilhão da morte,
Não tenha causticado o humano aporte,
De transcender a contingente fragilidade,
Resta esperar feliz e dinâmica eternidade.



<center>INDIFERENÇA SISUDA</center>

    O entorno da vida cotidiana, Virou o veneno que dimana, A endurecer os sentimentos, Perante humanos proventos.   Cumplicidad...