Nas
lidas cotidianas as tensões aparecem quando menos são esperadas, e, nos lugares
os menos desejados. Nem de longe todas elas impelem ao crescimento e à
qualidade de vida.
Parte
considerável das tensões decorre de auto-apreciações que levam pessoas a se
sentirem guardiães, geralmente de aspectos tradicionais. Então se fecham sobre
detalhes das coisas que fazem e ficam excessivamente atentas para que as outras
pessoas observem estes detalhes. Tornam-se, com isso, guardiães rigoristas em
torno do que pode e do que não pode ser feito. No campo de orações e praxes
devocionais, bem como das práticas rituais, os olhares de controle tendem a
ficar ainda mais aguçados para exigir um verdadeiro formalismo religioso.
O zelo pelos
detalhes secundários leva à perda do essencial. Diante do ensinamento de Jesus
Cristo, as comunidades dos seus discípulos, sem muita demora, encontraram
dificuldades para importantes inovações missionárias e a comunidade de
Jerusalém encontrou muita dificuldade para acolher e admitir o que vinha dos
ambientes da cultura grega, mais abertos e sensíveis às orientações de Jesus
Cristo e menos rigoristas nos detalhes normativos. Os de Jerusalém, que
pretendiam constituir-se nos guardiões das regras ético-morais e religiosas
decorrentes dos ensinamentos de Cristo, pelo excesso de zelo, perdiam a
capacidade de dar razão à sua fé e, num processo empobrecedor, queriam
normatizar a vida dos estrangeiros e dos judeus que viviam na diáspora, segundo
os critérios do seu ambiente.
O apóstolo
Paulo, que na sua auto-crítica pessoal já constatara o perigo que se esconde no
zelo, pois, enquanto era zeloso, tramava contra a liberdade dos outros e sentia
prazer em persegui-los e aprisiona-los, tinha se apegado a um legalismo
exterior. Mesmo depois da conversão,
precisou da intermediação de Barnabé para vir a ser acolhido na comunidade de
Jerusalém. Se não tivesse agido o bom senso de Barnabé, teria se rompido o
sentimento de pertença à comunidade católica.
Do bom-senso
daquele encontro, as tensões surgidas na diferenciação de normas dos que
atuavam em ambientes gregos em relação ao de Jerusalém, deram lugar à admissão
das diferenças, sem, contudo, romper a unidade da mensagem. Assim, a única
mensagem de Cristo adquiria fisionomias próprias em culturas distintas.
Este
importante fato da Igreja primitiva nos remete a lidar com as múltiplas tensões
de nossos dias, tanto pessoais, como comunitárias, religiosas e políticas. Há,
de um lado, o perigo de produzirem um processo entrópico, ou seja, de
fechamento e de acirramento fanático em torno de detalhes exteriores que pouco
ou nada tem a ver com o grande mandamento de Jesus Cristo. Por outro lado,
podem constituir-se em muito importantes meios para gerar crescimento na
qualidade da fé e de seguimento de Jesus Cristo.
Se a
intolerância perante pequenos detalhes vem produzindo, em nossos dias, um
imenso processo de sectarismo, com muitos mordazes e disfarçados processos de
excomunhão, convém lembrar que o projeto de Cristo é o de comunhão e não de
rupturas por pequenas ninharias.