quinta-feira, 29 de maio de 2014

Um testamento diferente



            Parece ser pequeno o número de casos em que a morte de uma pessoa idosa não deixa seqüelas de brigas intensas entre os filhos. Se o capital a ser repartido pode por si mesmo aumentar os olhares ambiciosos e invejosos entre irmãos, o pior é que, mesmo em torno de objetos de valor meramente simbólico, criam-se murmurações e desentendimentos.
            Em muitos velórios, enquanto umas pessoas prestam solidariedade aos familiares afetados pela dor da perda, e rezam com fervor para apresentar a Deus as melhores recomendações da pessoa falecida, filhos, ao lado, disputam aos berros a divisão dos bens. E não são poucos os casos em que a briga desta hora se estende para o resto da vida, a tal ponto de sequer retornarem a visitar o lar onde nasceram e foram criados.
            A despedida de Jesus Cristo, segundo o evangelista Mateus, teve uma peculiaridade muito deferente e especial que pode nos indicar uma preciosidade para as razões da nossa esperança. Mesmo que alguns discípulos viveram a dúvida em torno do que Jesus havia anunciado, antes de ser morto, subiram ao monte da Galiléia.
            A maior parte de todos os grandes sinais da interpelação de Deus nas narrativas bíblicas sempre aconteceu no alto de algum monte. Se um monte elevado propicia, pela altitude, uma sensação de exuberância que facilita a contemplação, é também símbolo do desejo de encontro com Deus.
            Foi no alto do monte que os discípulos passaram a entender que a despedida de Jesus Cristo não lhes legava algum capital, ou qualquer outro valor de barganha econômica, mas, lhes deixou um testamento inusitado: que continuassem a fazer o que Ele mais havia feito, e, que completassem sua obra redentora através da ampliação do discipulado em todas as partes por onde pudessem ir.
            Jesus assegurou sua presença e seu amparo aos que viessem a ser batizados como sinal de seguimento para, a partir deste sacramento, acrescentar gradualmente mais serviço em favor da construção do Reino de Deus.
            O batismo sugerido por Jesus Cristo certamente não visava apenas um ritual de passagem, mas, ser sinal do início de seguimento. Sua promessa de que o Espírito de Deus acompanharia os batizados, com certeza, visava muito mais do que um mero rótulo de ser católico, porquanto seria o grande sinal de iniciação para participar na construção da sua missão.

            O espantoso sensacionalismo de nossos dias em torno do Espírito Santo pode distanciar a centralidade do testamento de Jesus Cristo. Este requer, na verdade, uma mística, ou uma força interior cultivada na fé para produzir sinais e gestos que salvam.

terça-feira, 27 de maio de 2014

No enleio da prepotência



A quem dirigir a indignação,
Que impele o grito aos céus,
E solicitar prestimosa ação,
Contra os aparatos tão léus?

Causa real e veemente consternação,
O submeter-se aos ditames do terror,
De quem na gritante apatia da função,
Ignora as tradições de humano fervor.

Os homens de vermelho fardados,
Em prepotência sem precedentes,
Seguem dolentes e mui obcecados,
No antagonismo dos precedentes.

Da legislação a mudar a cada dia,
No fragor de aleatórios intentos,
Efetuam ignóbil e nefasta tirania,
Sobre as entidades e movimentos.

Nas chantagens revelam-se peritos,
Para solicitar mil e uma minudências,
E distantes de equacionar contraditos,
Eximem-se de quaisquer decorrências.

Na mais crassa e sórdida incompetência,
Procrastinam na inexplicável protelação,
Que indigna as entidades na sua paciência,
E deixa-as reféns da escancarada enleação.

Se omissões durante décadas revelam,
Nada justifica o seu engodo colossal,
E o prazer sádico com que protelam,
Para confirmar seu patamar abissal.

Se a triste sina de uma boate propiciou,
A enfunação da imagem e da aparência,
Carece, todavia, da básica competência,

Para o controle dos serviços que iniciou. 

quinta-feira, 22 de maio de 2014

Batismo e magia



            A expansão das primeiras comunidades cristãs caracterizava-se por estreita relação com o batismo e unção de crisma. A imposição das mãos aos batizados que aceitavam o itinerário de seguimento de Jesus Cristo, dava-lhes a certeza da atuação do Espírito Santo, porque junto com a memória do significado da ressurreição de Jesus Cristo, vinha a certeza da ação do Pentecostes, ou seja, a manifestação do Espírito de Deus.
            Em nossos dias, tanto o batismo quanto o Espírito Santo costumam ser interpretados numa perspectiva mágica. De uma longa herança da ancestralidade brasileira, o batismo passou a ser considerado ato literalmente mágico: o gesto da unção de água sobre a cabeça do batizando auferia-lhe, imediatamente, três condições: membro da Igreja, Filho de Deus e a garantia da vida eterna. Sob estes pressupostos, - praticamente de compra do Sagrado, - a comunidade, bem como crescimento na fé, através do um progressivo aumento de vivência dos traços básicos de Jesus Cristo, ficavam relegados.
            O sacramento da Crisma, celebrado como confirmação dos batizados na fé, através de um rito de unção e imposição das mãos sobre a cabeça, também passou por um processo de esvaziamento a ponto de ser buscado como mero rito de passagem, ou, como uma espécie de pequena formatura de um cursinho de crisma. Ao lado desta busca imediata e mágica da ação do Espírito de Deus, passou também a ser dispensado todo o dinamismo de crescimento para melhor ajudar a construir o reino de Deus.
            Ao lado do significado mágico da crisma, vivenciamos também, em nossos dias, um mapeamento do cotidiano em nome do Espírito Santo, como se Ele fosse um Deus acima de outros para acessos exotéricos de poderes e forças especiais. O pior é que geralmente esta presumida vantagem secreta de acesso ao Espírito Santo é usada muito mais para subir no status de poder pessoal e da precedência do que de um humilde peregrinar para a construção do projeto de Jesus Cristo.
            Deste pressuposto de acessos exclusivos e especiais, ao contrário do que nas primeiras comunidades se acreditava, delimita-se o lugar e a forma de rezar para acesso ao Espírito Santo. Antigamente se sustentava a inabitação do Espírito Santo. Em outras palavras, era a crença de que Ele não é “engaiolável” e restrito a certas pessoas e lugares. Ele poderia manifestar-se em qualquer ambiente e em qualquer situação.
            Por conseguinte, tanto a celebração do batismo, quanto da crisma, não requerem um conjunto de cerimônias e de rituais sensacionalistas, mas, constituem celebrações de iniciação na árdua tarefa de continuar a missão de Jesus Cristo.
O Espírito prometido por Jesus Cristo é, certamente, para animar as pessoas que desejam envolver-se mais intensa e profundamente nesta missão. Ele, com muita probabilidade vai se manifestar onde ocorre uma mística, ou seja, uma busca sincera de maior intimidade com Deus, e, com implicações éticas diante de formas tão injustas e desiguais na organização da vida em sociedade.


domingo, 18 de maio de 2014

Porta



 Com taramela ou fechadura,
Tranca ou controle eletrônico,
Ou da variegada envergadura,
Age com nobre papel sinfônico.

Melódica na separação de mundos,
Vive da enlevada e diuturna função,
Ora com rangidos e roncos fundos,
Ora na mais calorosa movimentação.

No real e importante papel mediador,
A porta pode abrir-se para a acolhida,
Ou para o nefasto processo protelador,
Sem ditames para a ação desmedida.

Na ação de isolar mundos distintos,
Pode fechar-se a toda maldade cruel,
E pode esconder devassos labirintos,
Da corrupção mais vistosa que vergel.

Oh! Se as portas dos muitos lares,
Pudessem abrir a sociais ditames,
Valores de mais retos patamares,
Para substituir os néscios e infames.



quinta-feira, 15 de maio de 2014

Nos caminhos da vida



            Motivações variadas, nem sempre escolhidas, nos levam a desejar saúde, bem-estar com outras pessoas, e mais, sentir que lhes causamos conforto, ao lado da percepção de que estas nos querem bem.
            Culturalmente recebemos uma orientação bem orquestrada e motivadora de que a felicidade é conquistada pelo acúmulo de bens e que a produção de bens, no livre mercado, gera equilíbrio e bem-estar entre todas as pessoas.
 Bem sabemos que este horizonte de motivações vem gerando sofrimentos profundos e desesperadores em grande parte da população terrestre. Onde, então buscar um caminho diferente?
A Bíblia nos mostra, de acordo com Jo 14,1-12, que Jesus diante dos caminhos de vida, traçados por Roma e, em Israel, diante dos caminhos traçados pela religião oficial de controle político e econômico, não optou por nenhum destes caminhos. Seu itinerário de conduta e, de orientação dos discípulos, apontou para o antigo sonho bíblico: o caminho de Deus!
Aparentemente seu indicativo de caminho estava distante dos caminhos acalantados pelos desejos das pessoas da época. Se algo pudesse advir de Deus, teria que ser, pelo menos, parecido com a imponência e a grandiosidade dos governantes. Além do mais, Jesus acabara de anunciar seu pressentimento de que seria morto em razão do que falava e do que fazia; mas, simultaneamente, passou-lhes uma palavra de muita segurança: o seu jeito constituía um caminho que levava a Deus.
Nesta interpelação, os discípulos logo queriam saber detalhes do caminho para tal alcance. Sua resposta foi a de que o caminho era aquele que Ele mesmo estava fazendo, acompanhado dos procedimentos que o notabilizavam.
Tratava-se de um caminho não para peregrinos à caça de milagres fáceis, nem de negociações particulares e intimistas para obtenção de favores e graças, mas, de um caminho que implicava em posturas morais e virtuosas como Ele as vivia. Ele não apontava para um caminho exotérico, abstrato ou meramente doutrinário. Apontava-lhes, todavia, seu itinerário e a concretude da sua vida como o melhor caminho.
No modo de ser de Jesus Cristo é que podemos encontrar a segurança da vida e o rumo que tanto desejamos ver, definido pela frente dos anseios de melhores dias. No amor e na fidelidade de Jesus Cristo, até o fim, é que se abre o caminho da verdade e da vida. O convite, portanto, é mais amplo do que pertencer ou não pertencer a uma determinada entidade religiosa.

Entre as tantas pessoas de nossos dias, que desejam conhecer a Deus, será, certamente, na aproximação dos gestos de Cristo que vão haurir o conhecimento de Deus. Assim, a vocação cristã, pessoal e da comunidade, é a de gerar relações humanas que se aproximem dos traços mais proeminentes da vida de Jesus Cristo.

terça-feira, 13 de maio de 2014

Catolicismo simplista



Na imensa onda subjetivista,
Subsume de forma sorrateira,
Movida pela força intimista,
A melhor esperança fagueira.

Enquanto o catolicismo comprometido,
Vai envolvido pelo descompromissado,
Emerge a onda pelo milagre pretendido,
E de quem já se considera emancipado.

Não faltam panacéias reacionárias,
Atentas por imagem e precedência,
Muito distantes das lidas ordinárias,
E sem os méritos da benemerência.

Ao lado de movimentos supranacionais,
Transformados em empresas lucrativas,
Fervilham as organizações pentecostais,
Com poderosas e alarmantes invectivas.

Se carismas e dons não são para dignidade,
Mas dotes para serem colocadas a serviço,
Requerem por isso mais da efetiva caridade,
Geradora de diaconia, comunhão e compromisso.





sábado, 10 de maio de 2014

Administração de bens



Quando o bezerro de ouro,
Aponta o paraíso extasiante,
Da felicidade sem desdouro,
Deixa todo mundo delirante.

Para melhor cuidar os bens,
E vê-los mais encantadores,
Briga-se por poucos vinténs,
Em torno de saldos e valores.

O desejo de cuidados seguros,
Faz administrar com destreza,
Para aproveitar até monturos,
Capazes de gerir mais riqueza.

A lida diuturna relega a amizade,
E no lugar da valiosa vizinhança,
Impõe-se a mais vil deslealdade,
Com vistas à polpuda poupança.

Ajuntar volumosos bens e isolar-se,
Como magno caminho da adoração, 
Mais confortável do que realizar-se,
Induz à mais depravada enfunação.

Na sofisticada e rigorosa burocracia,
Dana-se ao ralo a relação benfazeja,
Pois o que tão ilusoriamente delicia,
Não preenche o que o coração almeja.

Mais do que eficiente administração,
Cabe auscultar o que sobra da lida,
Já que sem a linguagem do coração,

Fecha-se valioso caminho para a vida.

quinta-feira, 8 de maio de 2014

Portas que fecham e que abrem



            Nas lidas de um dia normal, com certeza, cruzamos por muitas portas e, muitas vezes pelas mesmas portas. Umas estão fechadas e precisam ser abertas; outras estão abertas e convém que sejam fechadas por razões muito variadas. Por vezes para evitar sequelas do vento; em outras, para não expor a intimidade, ou para assegurar a privacidade.
            Como as portas da residência ou da área de serviço separam mundos, é natural que nem sempre devam estar abertas, e, é igualmente evidente que nem sempre precisam estar fechadas. Porém há muitas portas que se abrem, não para acolher e nem para desfrutar da condição “nidícola” do espaço doméstico. Há quem entra à força e, se uns tendem a entrar para efetuar roubos, outros procuram entrar, mesmo sem convite ou autorização, para invadir a privacidade.
            Muito amplo também é o mundo das portas que se abrem efusivamente apenas para alguns partidários de alguma ideologia ou de algum interesse precípuo e se fecham escancaradamente a todos quantos não interessam. Atrás desta ambiguidade das portas estão pessoas ou controles remotos que agem de formas a permitir cruzamento somente de pessoas conhecidas e selecionadas.
            Para o povo bíblico do tempo do exílio na Babilônia a triste experiência foi a de constatar que para ele já não existia nenhuma porta aberta. Entre os sentimentos de culpa diante dos percursos que o levou a tal fatalidade e a revolta diante da absoluta inviabilidade de pelo menos vislumbrar a possibilidade de que alguma porta pudesse abrir-se, o profeta Ezequiel se esmerava muito na insistência de que pelo menos Deus representava uma porta aberta, através da qual poderiam voltar a sonhar e articular um caminho de libertação.
            Mais tarde, na fase primitiva do cristianismo, quando outras dificuldades desanimavam os discípulos de Jesus Cristo, o evangelista São João lhes apontou uma rica imagem do significado de Jesus Cristo: primeiramente assegurou que Jesus representava um curral seguro contra ladrões e salteadores, mas que, simultaneamente, representava a porta de saída do curral e ele mesmo conduziria as ovelhas para outros lugares de fartas pastagens.
            Por conseguinte, fica também para nós a evidente dedução de que o jeito de Cristo evita que nos tornemos salteadores ou ladrões. Pela porta do seu caminho advém uma segurança, desde que se ouça sua voz, e, não a de estranhos que apenas abrem portas para manipulações interesseiras. Na sua alegoria somos igualmente interpelados a avaliar tanto a voz que mais ouvimos quanto modos de agir para oferecer segurança a quem vem ao nosso encontro e que também deseja o caminho seguro das fertilidades que a mãe terra produz.
            Na imagem das boas pastagens, com certeza, nós as desejamos ardentemente, mas, nos últimos tempos somos induzidos a desejá-las somente para nós mesmos e nos tornamos insensíveis aos outros que também anseiam por alguma participação. Ao mesmo tempo, constitui uma interpelação para não ficarmos acomodados na mesmice do cotidiano das rotineiras coisas e seguranças.
 Há muitas outras possíveis pastagens, também na qualidade de fé das comunidades cristãs. Da mesma forma, existem outras possibilidades alternativas aos detentores do poder que se pensam os únicos salvadores do povo. O triste espetáculo de tantos fatos de corrupção indica que se aproximam muito mais dos salteadores do que dos seguros condutores, capazes de levar para fora do redil das obsoletas barganhas interesseiras e dominadoras.




quarta-feira, 7 de maio de 2014

Estar em saída



Mais do que estar de saída,
Importa sentir-se em saída,
Pois implica sair da situação,
De confortável acomodação.

Em saída requer discernimento,
Para clarear o rumo que se quer,
No bem efusivo contentamento,
Que o bem-estar do viver requer.

O bom mesmo é poder perceber,
A intimidade em ação itinerante,
Movimentada a se rejuvenescer,
Ondulada por alegria irradiante.

Sentir o ímpeto de novas iniciativas,
Com a irradiação natural do alento,
Revigora e firma as forças mais ativas,
E as permeia de eficaz contentamento.

Em saída visa mais que conquistar,
Ou as meras injunções para mover,
A interioridade entrópica revisitar,

Para outro e novo modo de proceder.

terça-feira, 6 de maio de 2014

Recomeçar



Começar e recomeçar,
Arte tão esmilingüida,
Que interpela a vida,
A outra vez começar.

Como não está no remédio,
Nem nos encantos do tédio,
Requer muitas motivações,
Para aprumar as projeções.

O sonho de avançar na vida,
Rumo a uma ditosa velhice,
Impõe dura e árdua medida,
Para sair da ardida mesmice.

Idéias fixas de derrota e fracasso,
Bloqueiam a rica sensibilidade,
Independente de toda a maldade,
E encobrem o diuturno compasso.

Na aceitação de fatos ocorridos
Por mais que eles entristeceram,
Nem mudam os que morreram,
E nem os que ficam deprimidos.

Importa tirar luzes das derrotas,
E olhar para frente mirando rotas,
Que levem a re-encetar outras lidas,

 E substituir as motivações combalidas.

segunda-feira, 5 de maio de 2014

Tristeza melosa



Mais que melancólica,
Ou saudade bucólica,
Reina solta a tristeza,
Sem a menor presteza.

Tão pegadiça como a cola,
Contagia mais que virose,
E ao agarrar, não descola,
Nem mesmo com overdose.

Não vê sol que encanta,
E nem o túmulo espanta,
O diário humor cinzento,
De um desandar nojento.

Mumifica o cotidiano agir,
E em nada aceita progredir,
Pois sua essência mesquinha,
Em coisa nenhuma se alinha.

Vive da frágil complacência,
Nas compras de condolência,
E do capeta se torna um elixir,
Que tudo inventa a denegrir.

Se tudo é escuridão cansada,
Não estaria na hora da virada,
E apontar o olhar para frente,

Onde o novo emerge contente?

domingo, 4 de maio de 2014

Idéias e realidades



As muitas idéias produzidas,
Criam os fartos argumentos,
Que convencem por intentos,
E deixam pessoas seduzidas.

As mais belas mentiras repetidas,
Convencem nas falácias ardilosas,
Com muitas verdades distorcidas,
A ocultar deturpações escabrosas.

Quando as idéias se distanciam,
Das visíveis e objetivas realidades,
Viram sofismas que só anunciam,
As astúcias de crassas maldades.

Na distância das objetivas realidades,
Emergem os fartos purismos angelicais,
E fundamentalismos de idílicas verdades,
Com vastos e vis totalitarismos anormais.

Das idéias também florescem intelectualismos,
Que ficam distantes da bondade e da sabedoria,
Bem como, alienações dos abstratos idealismos,
Que em nada ajudam a propiciar efetiva alegria.

Na condição de ser mais ampla do que as idéias,
A realidade está aí, escancarada e clama por ações,
E contradiz a maior parte das sugestivas panacéias,
Criadas tão somente para controlar as multidões.


sexta-feira, 2 de maio de 2014

Alegria de viver



Sonho tão amplo como a vida,
Lá do âmago mobiliza o desejo,
De esvair-se da condição combalida,
E recuperar o encanto de novo ensejo.

Quando tantos se encontram bem enrolados,
Nas resistentes teias da tristeza e do isolamento,
Ou do vazio interior e dos outros emaranhados,
Tão poucas coisas caracterizam contentamento.

Não poderia o modo de ser cristão traçar novo caminho,
Para além da avassaladora oferta de consumo intimista,
E vencer os vastos e nefastos grilhões do estar sozinho,
Neste entusiasmado e mesquinho processo comodista?

Com a vida interior girando apenas no próprio foro,
Já não encantam serviços fraternos e humanitários,
E do possível espaço para os outros, já sem decoro,
Sobram apenas queixosos ressentimentos solitários.

A renovação do encontro pessoal com o projeto de Jesus,
Carrega certamente o potencial da alegria por Ele trazida,
E longe da desilusão que a tantos deste mundo seduz,
Resgata o sentimento de amparo e gratuidade enternecida.

Na busca da ternura, capaz de engendrar a alegria santa,
Sempre há espaço para recomeçar a redimensionar a vida,
E antever para além do que da força defraudadora encanta,
O bem-estar reconfortante que provém da humanitária lida.




quinta-feira, 1 de maio de 2014

A memória diante das expectativas frustradas



Com maior ou menor intensidade de sofrimento, temos que lidar, de vez em quando, com as tristezas e com as desilusões provenientes da simples frustração de sonhos ou de expectativas.
O sofrimento se aguça ainda mais quando cultivamos e acalentamos sonhos que não nos levam ao alcance de situações desejadas. Como, então, continuar a achar graça da vida e procurar outras motivações para ajeitar-nos conosco mesmos e com os outros?
O evangelho de Lucas (24,13-35) apresenta um relato que pode facilitar a lida com os desencantos da existência. Um primeiro aspecto indica que os protagonistas caminhavam decepcionados por causa de um grande sonho frustrado: esperavam um rei poderoso, forte, imponente, mas, o que encontraram em Jesus Cristo foi apenas um servidor humilde que convocava as pessoas a se envolver na construção de um reino novo, o reino de Deus. Por outro lado, em vez da ostentação de glórias, foi morto como subversivo, para os romanos, e, como deturpador da religião, para os judeus.
O aspecto interessante é que, apesar das tristezas e das dúvidas, a fé fragilizada dos jovens Emaús, ainda continuaram a caminhar. Dali decorreu o fato inusitado: reconheceram Jesus, ao fazerem recordação dos caminhos percorridos e dos percalços encontrados. Ao efetuarem a síntese, redescobriram razões para continuar caminhando. Partilharam a ousadia dos sonhos acalantados, mas, ao reconsiderar os fatos da forma amiga de Jesus Cristo, recuperaram especial fonte de alegria e serenidade.
A releitura do passado tornou-se, portanto, uma experiência que alargou a “razão fundante da fé”. Esta força renovadora fez com que continuassem andando, mas, com uma característica totalmente nova e distinta: passaram a ser alegres anunciadores da Boa Nova.
Os saudosismos estéreis e paralizadores ficaram para trás e eles encontraram motivações novas e redobradas forças para viver e partilhar uma mensagem de alegria.
Na fração do pão, símbolo da Eucaristia, os discípulos de Emaús aprofundaram sua fé.
Nós vivemos um discipulado parecido. Certos sonhos ideologizados frustram e machucam nossos sentimentos afetivos básicos. Todavia, quando “caminhamos” ao encontro de pessoas e reinterpretamos com elas os desencantos, facilmente ocorrem rápidas intuições de síntese que nos levam a continuar andando, e, com a peculiaridade da alegria no lugar das amarguras do coração.

Bom seria se nossa participação em encontros eucarísticos também pudesse despertar, ao lado da memória de Jesus Cristo, a memória dos nossos aparentes ou reais fracassos, e, ainda assim, facilitar a necessária síntese para que o núcleo da fé continue a mover-nos para além de alguns sonhos induzidos que decepcionaram. O que importa é a recuperação da alegria!

Os homens de vermelho



Dos antigos ataques flibusteiros,
Aos modernos atos guerrilheiros,
Persiste a prepotência crassa,
Da ignóbil e sórdida devassa.

Os homens fardados de vermelho,
Respeitados por apagar incêndios,
Depois da triste sina de Santa Maria,
Querem saber mais do que compêndios,
Na obstinada validação do seu Conselho.

Auferidos de um poder tirano e devasso,
Agem afoitos e encantados pelas propinas,
Ao impor sobre a população as duras sinas,
Do seu pendor despótico e do poder crasso.

Se a farda representa poder,
Por que tanta prepotência,
Diante da minudência,
Do pretenso casuísmo,
Em nada a se esmaecer?

Ineficientes no controle do que abarcam,
E distantes da cordialidade elementar,
Agem bem insensíveis no que demarcam,
Impedindo que algo se possa acrescentar.

Das muitas exigências que imputam,
Sobram as incontáveis reclamações,
Dos que com muita dureza labutam,
Renegados e sem acesso a apelações.




<center>ERA DIGITAL E DESCARTABILIDADE</center>

    Criativa e super-rápida na inovação, A era digital facilita a vida e a ação, Mas enfraquece relacionamentos, E produz humanos em...