quinta-feira, 11 de novembro de 2021

IMPLICAÇÕES DA SINODALIDADE

 

 

            Muito mais do que um procedimento técnico para um bom levantamento de dados, a intuição e a significativa proposta do Papa Francisco – de propor à Igreja Católica uma ampla participação de todas as suas instâncias na preparação do próximo Sínodo (sobre o tema da “Sinodalidade na Igreja”) – implica em novo modo de ser da Igreja. Não totalmente novo, pois, as primeiras comunidades cristãs se orientavam pela Sinodalidade, uma vez que todos os batizados participavam das decisões.

            Aristóteles já alertava, muitos séculos antes do cristianismo, que a extrema democracia significava anarquia. Na verdade, não é possível que todos participem de tudo o que se decide coletivamente. Conhecemos a característica no campo político em que delegamos pessoas pelo voto para que nos representem. Algo similar também ocorre na Igreja, e, pode ocorrer que os delegados já não representem os anseios dos que os elegeram a fim de serem seus representantes, e estes delegados, ao invés de representar as bases, agem autoritariamente sobre estas bases e se tornam insensíveis aos seus clamores e anseios.

 O Concílio Vaticano II, recuperou a antiga riqueza da auto-concepção da Igreja, não mais como pirâmide de hierarquias, mas, como Povo de Deus, simbolizada numa roda de conversa. O Papa tem sua função de serviço, entretanto, não é mais do que qualquer pessoa leiga. Assim, também bispos e padres não são mais do que leigos. No entanto, a ação da Igreja ainda seguiu refém de instancias específicas de poder na condução da Igreja. Deste modo, os importantes sínodos de bispos que desde então foram efetuados, em número de vinte e nove, foram valiosos, mas, envolveram apenas bispos e peritos.

A convocação do Papa Francisco para o próximo Sínodo de 2023 deu um passo radical e inusitado: se a visão de bispos é importante, não seria mais importante ainda, contar com a participação de todas as instâncias da Igreja, valorizando a dimensão do batismo e da comunidade, como condição de participar responsavelmente nas decisões dos rumos da Igreja?

O valor dado à participação das comunidades nas definições da Igreja é, para os nossos dias, um lume, ou um clarão de esperança com vistas a maior corresponsabilidade na Igreja, porquanto a pirâmide dos escalões mais elevados como definidores do que é bom, correto, certo e justo, cede espaço para a circularidade e a voz dos que há séculos foram tidos como destinatários passivos. A nova intuição indica luzes proféticas para o bom desempenho da Igreja no serviço de promover o Reino de Deus anunciado por Jesus Cristo.

            Tal perspectiva permite entender a reação de grupos, sobretudo clericalistas, contra a proposta do Papa, pois, relativiza espaços e condições conquistadas. Como em qualquer outra instância humana, seja política, sindical ou de classe, quando grupos se mobilizam pelo alcance de maior nível de direitos, vantagens e liberdades, a tendência natural é a de querer ampliar ainda mais estas condições conquistadas; mas, jamais de perde-las ou reduzi-las. Assim, grupos sociais se tornam conservadores, pois, não admitem retroceder ou perder no que já conquistaram.

            A nova maneira de ver e de agir na Igreja numa perspectiva mais colegiada, representa uma renovação profunda na maneira de agir da Igreja, uma vez que vai perpassar toda a prática de lidas nas dioceses, paróquias e pequenas comunidades. Não constituirá apenas uma nova metodologia para um sínodo, mas, despertará todo o modo de ser e de agir da Igreja, para não só ser mais democrática, mas, ser realmente sinodal.

Do que conhecemos de democracia, sabemos que ela depende das opiniões e de grupos que impõem votos e argumentos para que sua defesa e seu ponto de vista prevaleça. Equivale a um parlamento onde a decisão mais argumentada prevalece. Sinodalidade tem outra perspectiva, uma vez que implica em escutar mais do que fazer prevalecer um desejo ou uma opinião. Da escuta, com oração, nasce o discernimento. E discernimento equivale a bom-senso que não necessariamente vai impor a ideia de um grupo de interesse e de sua capacidade de barganha.

Sinodalidade, por conseguinte, significa processo, cuja síntese pode demorar mais do que desejamos, porque implica em subversão da forma tradicional de definir rumos e projetos. Evidentemente se um voto de um batizado comum vale tanto quanto o de uma autoridade eclesiástica, e se esta estava acostumada a sentir o peso da sua palavra na definição dos rumos da Igreja, irá sentir a perda do seu poder, e, um dos mecanismos de auto-defesa será o de combater a Sinodalidade.

A Sinodalidade irá exigir outro modo de agir da autoridade, seja ela de bispo, de padre, catequista, ministro (a), ou de qualquer outro serviço de animação na comunidade. A tendência natural de mandar e dar a última palavra não funciona na Sinodalidade. Ainda que não seja possível levar em consideração o que cada membro batizado da Igreja espera para o seu futuro, pelo menos o maior envolvimento participativo significa procedimento profundamente inovador, porquanto o caminho não será definido por autoridades eclesiásticas e de peritos, mas ele vai decorrer do que advém dos cristãos batizados. Somem, assim, os ares definidores de escalões mais elevados de poder, para darem espaço e expressão ao que advém da base da Igreja.

A Sinodalidade não vai descaracterizar o serviço do Papa, nem o dos cardeais, bispos e padres, porém, vai leva-los a agir, não a partir do que eles pensam, mas do que captam do senso comum e de outras instâncias de animação das comunidades cristãs.

O que se pode antever de uma Igreja mais sinodal? Primeiramente são dificuldades e tensões, pois, constitui processo que precisa ser aprendido e com necessária humildade para escutar sem logo exercer a hegemonia de dar conselho e de indicar a solução. Há problemas que não podem ser resolvidos na hora e na força. Precisam de síntese entre perspectivas conservadoras e progressistas, que por vezes leva mais tempo do que se gostaria. Imagine-se tal procedimento para conselhos administrativos, pastorais, econômicos e de coordenação de movimentos e serviços numa comunidade! Não caberá mais a um pequeno grupo ou uma pessoa ditadora decidir pelos demais. Começar a valorizar diferentes grupos de uma comunidade e não somente refletir teoricamente sobre os problemas, requer novo modo de proceder nas reuniões e assembleias das comunidades católicas. Requer uma conversão do coração e da mente para a escuta recíproca, ainda que possa parecer chata. O Papa Francisco alertava na homilia do dia 10/10/2021, na abertura do Sínodo, que é necessário que nos tornemos “peritos na arte do encontro”, mais do que na capacidade de promover grandes e bonitos eventos. E, mais do que escutar com os ouvidos, far-se-á necessário escutar com o coração e permitir que ocorra circularidade e não domínio de opiniões. Com isso emerge um traço que provavelmente vai marcar nossas comunidades: a riqueza do colaborar. Será enfim, uma perspectiva de diminuição progressiva da centralidade clericalista e, com maior emergência da participação de leigos nas comunidades.

Sinodalidade certamente levará a Igreja Católica a ir além de um pernicioso clericalismo que tende a concentrar e a definir os rumos da Igreja a partir de suas pressupostas tradições, mas que não necessariamente levam à raiz da tradição cristã que é o Evangelho.

Sinodalidade aponta para uma animadora integração de três dimensões: comunhão, participação e missão. Foi Cristo quem conclamou para a comunhão e quanto mais gente atua neste importante trabalho, também mais gente estará exercendo valiosa e admirável missão para uma Igreja coesa que atua beneficamente em favor da boa convivência das pessoas e a convivência equilibrada destas pessoas com o planeta.

segunda-feira, 1 de novembro de 2021

MORTE

 

Tão evidente e indesejada,

Gera reação não planejada,

E remete a olhar atencioso,

Para o ato de fé auspicioso.

 

Mais que lógica e evidente,

Indica na situação iminente,

O horizonte para a angústia,

Como contagiante moléstia.

 

Revela a total incapacidade,

Da aquilatada religiosidade;

Desperta raiva com tristeza,

E desampara, sem presteza.

 

Produz tanta dor e lamento,

Sem fornecer deferimento,

Para esticar amarga penúria,

Mesmo com sofrida lamúria.

 

Produz clamores insistentes,

Com desejos muito ardentes,

Para a protelação do colapso,

Ante o tão esmilingüido lapso.

 

Desperta medo tão aterrador,

Dum julgamento perpetrador,

A dizer que escolhas na vida,

Desviaram a rota pretendida.

 

Evidencia a condição humilde,

Do valente e enganoso molde,

Que preteriu a relação fraterna,

E roubou a perspectiva eterna.

 

Leva a externalizar o lamento,

Da negação do acontecimento,

Para culpar a maldade de Deus,

Sem admitir um gesto de adeus.

 

Teima-se, então, na barganha,

Da causa desta ação estranha,

Supondo a explicação do fato,

Como solução do estranho ato.

 

No luto passivo fica ignorado,

Um poder que o emaranhado,

Tem para direcionar a atenção,

Visando a dolorosa reinvenção.

 

 

 

 

 

 

 

<center>ERA DIGITAL E DESCARTABILIDADE</center>

    Criativa e super-rápida na inovação, A era digital facilita a vida e a ação, Mas enfraquece relacionamentos, E produz humanos em...