Toda
lei costuma ser decorrência de uma experiência passada que deu certo. Pode ser
lei escrita ou implícita. O desejo de não perder o efeito daquela experiência,
leva a criar normas, a fim de assegurar a continuidade daqueles êxitos.
Portanto, quando na linguagem religiosa e bíblica nos referimos à lei, não se
trata de uma regra isolada.
Trata-se de um conjunto de normas que
procurava, na história do povo bíblico, manter o futuro de grupos humanos
dentro dos quadros de coesão daquela de integração de tribos com culturas,
histórias e sonhos diferentes. O intento levou a uma experiência de síntese na
pluralidade, que apontou um horizonte de muitas possibilidades para melhorar a integração
social, nada fácil, através do pacto da aliança no Sinai, estabelecida nos
conhecidos dez mandamentos.
Se
imaginarmos pais na lida com crianças pequenas, podemos observar que nem toda
forma coercitiva leva a bons resultados. Ocorrem geralmente muitas tentativas
para a obtenção do controle: pode ser apelo a medos, a privações, a ameaças, a castigos
ou, recompensas por êxitos. Sem se darem conta, os pais se vêem obrigados a
apelar para mais e novas regras, a fim da manter a criança sob os ditames de
suas expectativas. Assim, com facilidade, as poucas regras, mesmo não escritas,
vão gradualmente aumentando de número. De repente, a eficácia das normas
estabelecidas caduca, e se precisa descobrir outra regra para coibir ou
estimular determinado comportamento.
A Bíblia
revela que a partir da Aliança das doze tribos no Sinai, a Lei significava o
conjunto dos dez mandamentos. Ao perderem a força de persuasão, estes dez
mandamentos foram, aos poucos, acrescidos de outras para complementá-las. No
tempo de Cristo, o número de acréscimos já passava de 600, mas, mesmo assim, o
efeito do que os dez mandamentos visavam, nem por isso estava sendo alcançado.
Jesus Cristo
soube renovar o efeito ético, social e religioso destas mais de seiscentas e
tantas leis para uma única regra, segundo Mateus, expressa sob dois aspectos:
amar a Deus e ao próximo. Há quem interpreta esta regra de forma mais simplificada:
amar o próximo, pois, quando se ama o próximo, simultaneamente já se ama a
Deus.
Muito mais
do que dar eficácia ao esvaziado conjunto de regras, Jesus apontou para a construção
positiva da convivência e, na dedicação e atenção à condição humana, mostrou de
forma muito convincente que assim demonstrava amor a Deus.
Ao longo da
história da Igreja, que quis ser fiel a este único mandamento, e para assegurar
o êxito desta regra, já acrescentou milhares de outras; e sentimos, hoje, uma
sensação desconfortável de que se constituem um fardo pesado que, mais
atrapalha do que ajuda ao bom entendimento e respeito na convivência com
pessoas e com a natureza.
A proposta
de Cristo certamente continua a ser magnífico horizonte para orientar os rumos
da convivência, mas, de forma parecida com a dele, precisamos simplificar o
casuísmo de regras para que voltem a ser meio que facilita a vida.
Mais do que
apelações ao maior mandamento para submeter outras pessoas, importa clarear
luzes que nos tornem melhores e menos excludentes com incontáveis exigências. O
amor filial não pode sucumbir sob o falso apelo às muitas cobranças: afinal,
Jesus apontou um caminho que salva e não um caminho que escraviza através de
perversos controles, multiplicados à exaustão por meio de regras.