sexta-feira, 31 de julho de 2015

Transmissão de fé



Quando referências seguras implodem,
E quando variados caminhos eclodem,
Os discursos moralistas não motivam,
E, tampouco, para o arrocho cativam.

As muitas normas implícitas e explícitas,
Longe de despertar situações solícitas,
Apesar de gestoras de homogeneidade,
Não gestam avanços de boa qualidade.

A larga tentação da auto-centralidade,
E de doutrinar para a própria vaidade,
Pode levar à ascendência hierárquica,
Mas deixa a vida na direção anárquica.

Se o profetismo só aponta submissão,
Como melhor itinerário de redenção,
Como encontrar no mundo pluralista,
Um indicativo de algo melhor à vista?

O tradicional caminho de salvação,
Carece dum eficaz modelo de ação,
De um Jesus menos desencarnado,
E de um agir mais compromissado.

No meio de tantas vias e filosofias,
De piedades e de muitas rezas pias,
Eclode a desafiadora interpelação:
Testemunhar com menos apelação. 






Fé em torno do imediato



Na ambiguidade das buscas, a satisfação do imediato parece, normalmente, sobrepor-se aos projetos de longo prazo. Assim que o alcance da comida, da vantagem e da possibilidade de fazer reserva se esvai, a conversa se transforma em lamúria e o olhar da fé remete com facilidade para os tempos passados. Estes, então, passam a ser estabelecidos como novo horizonte de ideal a ser buscado.
Basta ver como muita gente, em meio à crise de nossos dias, fica insinuando, com saudosismo, a volta de formas de governo já deixados de lado, como o da ditadura militar, e defende ardorosamente aquelas mediações como melhor caminho de redenção para nossos dias.
Da experiência religiosa decorrente da fé em Deus, algo similar se repetiu em diversas ocasiões da história bíblica. Basta lembrar o episódio da fome no meio do deserto, com murmúrios e lamentações de que teria sido melhor continuarem escravos no Egito do que morrer de fome naquele lugar inóspito. Bastou encontrar resina de tamareira para matar a fome, que o assunto tomou totalmente outra dimensão. Viu-se nisto uma intervenção de Deus e, euforicamente, apareceu o desejo de mais “pão caído do céu”.
Dos antigos murmúrios, ao de nossos dias, salientam-se, nestes lamentos, muitos anseios interesseiros e, numa mágica, adapta-se a memória do passado, para fazê-la passar a ser insinuada como isenta de sofrimentos e de contrariedades profundas. Afirma-se, simplesmente, que aquele tempo era um tempo feliz, mesmo tendo havido muito desrespeito e clara afronta à dignidade das pessoas.
Nas multidões que procuraram Cristo, o desejo imediato pelo provisório, impedia perceber nos seus sinais um itinerário de construção da vida segundo a vontade de Deus. A cegueira de fé, daquele momento, permitia apenas enxergar o pão que ia para o estômago. Como o povo do deserto esperava de Moisés a intervenção para mais resina de tamareira, os que iam ao encontro de Jesus, tampouco entendiam o alcance do que pregava: trabalhar para saciar outra fome mais profunda: o seu jeito de ser, indicava um modo de vida para muito além da mera comida diária e das formas sensacionalistas de obtê-la dentro de certas regras estabelecidas.

Jesus apontava, aos interesseiros, um horizonte de plenitude: chegar a uma vida de mais qualidade! É o “pão da vida”.

sexta-feira, 24 de julho de 2015

Santidade demoníaca



Distante dos estilos visionários,
E dos abnegados missionários,
Está o caminho da santidade,
Dum ideário de muita piedade.

Vistosos ícones para exibição,
Alardeiam um ar de proibição,
E nos detalhes de muitos ritos,
Arvoram ser especiais peritos.

Vagos, vazios e bem moralistas,
Querem indicar genuínas pistas,
Para discipulado de submissão,
Da sua própria auto-afirmação.

Disputam a unhas a precedência,
Apesar da imagem em evidência,
Mas, bem carentes de reputação,
Colhem uma mesquinha relação.

Vivem somente de quinqüilharias,
E se magoam por pífias ninharias,
Sem irradiar sinais de santidade,
E sem avançar na hospitalidade.

Perpetram demoníaca divisão,
Sob a santidade de presunção,
Sequer atingem uma lealdade,
Para dirimir extensa maldade.




quarta-feira, 22 de julho de 2015

Partilha do pouco que se tem



            Os pioneiros da formação do povo de Israel experimentaram, como um feito notável de Deus, a graça de encontrar maná, num oásis do deserto, quando sua fome já estava no limite da suportabilidade.
            Mais tarde, o profeta Eliseu, conhecido como homem de Deus, teria saciado cem pessoas com apenas vinte pequenos pães, num momento limítrofe de fome, devido a uma grande estiagem que assolou toda a região.
            De acordo com São João, Jesus de Nazaré, diante da proximidade da festa de Páscoa, foi à montanha – símbolo dos grandes eventos de Deus – e ali, orientou os discípulos para que, da docilidade do pouco que eles representavam, poderia nutrir-se uma multidão! O pouco de pão, de uma pessoa anônima, constituiu o sinal mediador da ação de Deus.
            Em Jesus Cristo, o povo do seu tempo percebeu um sinal muito mais evidente da ação bondosa de Deus do que a efetivada no deserto e nas pessoas de Elias e Eliseu: Jesus teria alimentado cinco mil pessoas, com cinco pães, e ainda teriam sobrado 12 cestos cheios. Trata-se, com evidência, de uma mensagem relativa à messianidade de Jesus Cristo. Mais do que insinuar um ato milagreiro mágico, a descrição da multiplicação dos pães, remete a um quadro simbólico muito rico e significativo: no agir de Cristo, torna-se presente o agir de Deus, e, preenche o anseio das pessoas por sentido!
            Jesus incumbiu os discípulos a partilhar do pouco que tinham, mas, este pouco de sentido existencial, não só alimentou o sentido de uma grande multidão, mas permitiu uma sobra dos cestos cheios. Em outra linguagem, quando os discípulos partilharam do pouco que tinham assimilado de Jesus Cristo, souberam orientar eficazmente a muita gente, e, simultaneamente, perceberam que isso fez um bem enorme à sua própria existência. A sobra também indica, teologicamente, que nada do que se partilha fica sem um retorno gratificante. Os doze cestos lembram as doze tribos de Israel e que a irradiação dos serviços dos doze apóstolos poderia atingir todo o povo de Israel e chegar aos confins da Terra.
            O entusiasmo dos saciados logo descambou para a dimensão política: queriam aclamar Jesus como rei para melhor assegurar que continuasse a fornecer pão. Jesus, no entanto, desapareceu do ambiente de rumor e foi para um lugar deserto...
            O Evangelista São João percebeu em Jesus um caminho messiânico muito mais amplo e mais explícito do amor de Deus.

            O pão, que lembra a centralidade dos gestos de Jesus Cristo, continua, ainda hoje, a nos interpelar para que estes gestos sejam irradiados em meio à multidões de famintos de sentido e de razões para a sua existência. 

segunda-feira, 20 de julho de 2015

Delírio pela reputação



Olhares, sorrisos, gestos e meneios,
Tão favoráveis ao alcance de anseios,
Desviam o foco das bondosas ações,
E deságuam em ambíguas confusões.

Nas ambiguidades dos atos religiosos,
Nem sempre tão justos e prestimosos,
A santidade, travestida de demoníaca,
Sucumbe na depravada ação maníaca.

Ao endeusar o próprio estilo de vida,
Veem a vida alheia como denegrida,
E já se julgam no direito da violência,
Para forçar os outros à subserviência.

No repertório das razões justificadas,
Eclodem políticas oficiais e desejadas,
Para impor um estilo de vida definido,
E divinizado para ser aceito e seguido.

Propugnadores da identidade superior,
Para prevalecer sobre o resto inferior,
Apelam a variados pretextos violentos,
Para forçar o alcance dos seus intentos.

Esvaziadas as raízes religiosas ancestrais,
Estabelecem vagas religiosidades fulcrais,
Como marcadoras de seu poder violento,
E, sob o desejo da reputação como alento.


quinta-feira, 16 de julho de 2015

Hierofanias



São tantos e tão diversificados,
Os relatos de ação paranormal,
A salientar os divinos legados,
Do muito além da vida normal.

Sem como explicar o inefável,
Através de palavras limitadas,
Volta uma recordação afável,
Das interpelações extasiadas.

Na experiência da inaudita ação,
Emerge inusitado compromisso,
De redimir outros da prostração,
E superar o vil estado submisso.

Fundamenta-se o elã de redenção,
Que muda motivações subjetivas,
E energetiza a capacidade de ação,
Para boas transformações efetivas.

Da experiência do efeito encantador,
Nasce a indelével e forte capacidade,
De alargar vasto horizonte alentador,
Em setores remediados da sociedade.

A renovadora força de persistência,
Para além do complexo messiânico,
Desperta uma vigorosa resiliência,
Que inibe qualquer efeito satânico.



quarta-feira, 15 de julho de 2015

Capacidade de apascentar


           
É notável e preocupante como muitas pessoas desenvolvem fenomenal capacidade de apascentar coisas, objetos, imóveis, mas, na perspectiva de submeter outras pessoas, visando que estas dependam de seus interesses e se tornem acolhedoras passivas de seus ditamos.
A crise econômica e a política aguçam ainda mais o clima de insatisfação em torno do que deva ser feito para que as pessoas, já constituídas vítimas de um sistema espoliador, mesmo que teoricamente chamadas de cidadãs, não sejam simplesmente ignoradas, mas, que recebam os cuidados básicos e vejam assegurados seus direitos elementares.
Neste contexto, tanto lideranças políticas quanto religiosas facilmente se debruçam sobre discursos teóricos que, na verdade, não ajudam em nada as pessoas necessitadas de melhoria da qualidade de vida e que andam sedentas por uma vida mais digna e respeitada.
Como o povo bíblico costumava usar imagens das lidas cotidianas e aplicá-la à realidade de fé do seu tempo, tornava-se frequente a comparação de pastor, que cuida ou que deixa de cuidar das ovelhas, com os evidentes efeitos de segurança ou de desamparo.
Até mesmo o termo “pastor”, em nossos dias, pode conotar significados muito diversos, mas, da antiga comparação rural, algo ainda permanece valioso: é preciso ser bom pastor! E nada melhor do que lembrar como Jesus Cristo reuniu os seus discípulos, depois de enviados, para avaliar os primeiros resultados (Mc 6, 30-34) e reconsiderar a necessidade de agregar pessoas que andavam dispersas pela vida e que migravam movidos por uma carência profunda. Ele mesmo as interpretou como ovelhas sem pastor, porque a religião estabelecida há mais tempo, as ignorava.
Como nos dias de Cristo, ao lado da fome de comida, vem se manifestando em nossos dias, outra bem mais profunda: fome e sede de sentido para a existência humana. Se em Cristo as multidões encontraram sentido, os seus seguidores, especialmente os mais próximos que eram os apóstolos e discípulos, foram convidados a ajudá-las com desvelo de boa orientação para o alcance do sentido, tão desejado pelas pessoas com quem se encontravam pudesse efetivar-se.

Os discípulos e discípulas de hoje, mais do que pautar sua conversa em torno de muitas obrigações, de muitos requisitos e exigências extenuantes são, como os apóstolos, convidados a anunciar por palavras e gestos outro modo de relações do que o do desfrute, o do controle e o da submissão. Cabe-lhes a importante ajuda para que as pessoas se emancipem do que as aprisiona em situações de dependência e de abandono. Por outro lado, convém que encontrem nos cristãos, constituídos em pastores ou pastoras, não o moralismo separador, nem a destruição de seu legado religioso e, muito menos, a exploração de suas esperanças. Mais do que ritos mecânicos ou meramente rubricistas e formalistas, compete aos cristãos facilitar o acesso ao Cristo Ressuscitado, que não recomendou nenhum fardo pesado e enfadonho a ser exigido dos que estão à busca de sentido.

terça-feira, 14 de julho de 2015

Assédio espiritual



A banalização do assédio sexual,
Elevou ao patamar sensacional,
O direito de agir com persuasão,
Para forçar os fiéis à submissão.

Movidos por estranho fanatismo,
E mergulhados no diletantismo,
Almejam ovelhas gordas agregar,
Para seus egos muito resfolegar.

Esquecem todo respeito à diferença,
E se arrogam superiores na crença,
Para muito falar e colocar ditames,
Apesar dos procedimentos infames.

Distantes do respeito elementar,
Nada bom percebem para acatar,
E obcecados no afã de convencer,
Tampouco se abrem ao enternecer.

Apelam a poderes extraordinários,
Apesar de parcos frutos ordinários,
E, já cegos por controle obstinado,
Aferram-se no fanatismo obliterado.

Debulhadores de moral e de ameaça,
Já não manifestam uma divina graça,
Nem respeitam elementar diferença,
Para dialogar em torno de boa crença.

O demônio do mais nefasto poder,
Centralizado no rotineiro proceder,
Presta-se ao controle da sutil tática,
Que enquadra em conduta apática.

Produz-se assim uma religião forte,
Da passividade em torno da sorte,
Que disputa entre outros arautos,

A submissão de humildes incautos.

quinta-feira, 9 de julho de 2015

Emotividade



Ativada já antes da contagem do tempo,
Revela-se em tudo e até no contratempo,
Uma fonte de coloração e alegria na vida,
Ou, dos medos intensos e raiva incontida.

Anda, e no vasto psiquismo se organiza,
E nos neurônios do estado físico desliza,
Para envolvê-lo no embate e na disputa,
Ou, para desviar o foco e desistir da luta.

Enquanto uma força incita para o embate,
Outra, sorrateira, busca evitar o combate,
E a força da serenidade sucumbe ao furor,
Quando extrapola todo humano pundonor.

Não pouca raiva é deslocada de sua origem,
E irradiada sobre tantos outros na vertigem,
Sucumbe na ira, que abala e muito estressa,
Além de denegrir a vida e piorá-la depressa.

Assim a alegria foge do âmbito dos anseios,
E sem encontrar emoções para bons floreios,
                      Requer a motivação de ambiente estimulador,

Para integrar tanto medo e tão raivoso torpor.

quarta-feira, 8 de julho de 2015

Fraternidade e paz



            Na medida em que os bons anseios de paz e de fraternidade são acalantados entre os melhores sentimentos humanos, vivemos o desconforto de muitas transformações técnicas, científicas e culturais que manipulam o conceito de felicidade e o associam ao intenso consumo de objetos e coisas. E quando tudo vira suscetível de descarte, também o ser humano se vê mergulhado no mesmo determinismo catastrófico: virar um lixo descartável por muito pouca coisa, ou tornar-se vítima fatal, por razões estúpidas.
            Jesus, ao lidar, sob um quadro político perverso e, em meio a ódios decorrentes de fundamentalismos e fanatismos religiosos, convocou os discípulos para uma importante missão: anunciar a iminência das possibilidades de uma vida muito diferente e dar sinais da irrupção deste reino novo. Não os incumbiu de um poder em benefício próprio, mas, de ação positiva sobre a maldade, sobre as doenças e sobre tudo quanto estava sendo um reino de morte.
            Na delegação de serviço, Jesus não repassou nenhum segredo mágico, mas, orientou para uma presença positiva no meio das múltiplas fontes e forças de morte. Teriam que ir de dois a dois para se complementarem no conteúdo da mensagem a ser transmitida e, para melhor deliberar sobre os possíveis caminhos capazes de despertar à pertença de uma comunidade.
            Em nossos dias não faltam anunciadores que falam em nome de Jesus e que dizem agir sob sua orientação, mas, pelos resultados do charlatanismo, mais servem para oferecer uma felicidade mágica, que, apenas se enquadra na manipulação do sistema, a fim de transformar pessoas em meras consumidoras, quer de milagres prontos, ou de presumidas felicidades que não mudam as lidas com o entorno.
            Na recomendação de Cristo (Mc 6, 7-13) também esteve presente um pedido  importante: não ser impertinente, chato e insistente à exaustão para forçar as pessoas à submissão. O anúncio deveria direcionar-se aos que acolhem, na fé, e, apesar da praxe de hospitalidade que era própria da época, não deveriam abusar deste costume.
            Atualmente o comprometimento em torno da diminuição de violências, de acumulações injustas e de planos diabólicos que acabam espoliando as pessoas, sob o pretexto de bons negócios, inviabiliza a capacidade de distinguir quem trabalha em favor da humanidade, de quem se move por apontar muita felicidade, pelo mau espírito de explorar e de dominar as pessoas. A tarefa, portanto, mais do que expulsar demônios, passa ser a da participação num trabalho que possa diminuir forças diabólicas de mentes humanas, o que requer um difícil itinerário de construção.

            

terça-feira, 7 de julho de 2015

Um feixe de carências



Da frágil condição humana,
Um vasto anseio promana,
Por gestos de completude,
Do horizonte de plenitude.

Basta que algo ou alguém,
Manifeste algum desdém,
Que a ansiedade palpita,
E a insatisfação regurgita.

O equilíbrio então decai,
E a desejada paz se esvai.
Aparece a melosa tristeza,
Que absorve a singeleza.

As carências não supridas,
Geram sensações sofridas:
Partes acabam sufocadas,
Outras voltam mal amadas.

Ao lado de bom alimento,
             Necessita-se de um alento,
De pertença confortadora,
De auto-estima propulsora.

No anseio de perfeição,
Anela o da socialização,
De um amor crescente,
Sobre o remanescente.

Nas carências ressoam,
Dos fatos que destoam,
Medos e raivas retidas,
Das mágoas reprimidas.

No anseio das buscas,
Saem rusgas bruscas,
Que ofuscam a lida,

De anelos pela vida.

sexta-feira, 3 de julho de 2015

Febre mariológica



Com temperaturas alteradas no quadro orgânico,
Emergem expressões de automatismo mecânico,
Que já distantes do caminho indicado por Jesus,
Explicitam uma doença na qual a fé pouco reluz.

Mesclada a sintomas ambíguos da exterioridade,
Advindas de um estado mórbido da subjetividade,
Transformou-se a devoção num produto de venda,
Com mediação de cura e de bricolagem que renda.

Aparentemente é muito bom tudo quanto é mariano,
Mas existem manobras ingênuas de interesse insano,
Que inibem a pertença e adesão a Jesus e seu projeto,
E manipulam na exterioridade de um controle abjeto.

Conduzida na pragmática da intencionalidade pastoral,
Porque agrada, agrega e justifica uma atividade laboral,
Esvazia comunidades dos compromissos humanitários,
Sob um aparente sucesso de formalismos reacionários.

Deslocada da mediação para Jesus e para seu itinerário,
Maria, restrita a santa poderosa e de um afável ideário,
Fica refém da eficácia das fórmulas e detalhes nos ritos,
E afasta o cunho bíblico-litúrgico dos básicos quesitos.

O perfil evangélico de Maria, longe da visão ingênua e purista,
Para além do afã de grupos midiáticos de exploração moralista,
Indica com certeza itinerário e horizonte de ação mais eclesial,
E, menos mãezinha do céu, aponta ao filho Jesus na base local.


quarta-feira, 1 de julho de 2015

Vozes incômodas



            Os grandes profetas do primeiro testamento da Bíblia, de distintas épocas, tiveram que lidar com o desconforto de suportar duras críticas ao seu discurso. Mesmo preocupados com o melhor, e, desejosos de ajudar o povo a manter-se coeso em torno da fé que o unia a Deus, os profetas revelaram sofrimento intenso, causado pela rebeldia às suas orientações. Ezequiel chegou a chamar seu povo de “nação rebelde”.
            No evangelho de Marcos (6,1-6), revelam-se dificuldades que Jesus encontrou em sua própria terra natal, um pequeno povoado que certamente somava de 25 a 30 famílias pobres, morando nas cavernas de um paredão de pedra rochosa. O texto também fornece as razões da adversidade que Jesus padeceu naquele ambiente. Aqueles moradores sabiam do encantamento por Jesus nos lugares por onde passava. Também eles o admiravam pelo sucesso. No entanto, tinham uma peculiaridade: não tinham fé! Quiseram tão somente valer-se de vantagens. Esperavam uma ação extraordinária que os promovessem a uma notável ascensão social.
            Mesmo sendo filho de um profissional conceituado daquele ambiente, pois, era filho de carpinteiro, viu-se Jesus diante de uma incredulidade preconceituosa. No seu imaginário religioso aquela comunidade de Nazaré, certamente, cultivava uma imagem de um Deus parecido com o de tantos movimentos religiosos de nossos dias: grande sensacionalismo de curas, de milagres, de libertações, enfim, uma ação de transformação instantânea e de grandes impactos para persuadir através de um ar triunfalista.
            O olhar focado para interesses imediatos e que propiciassem rápida auto-afirmação, impedia aquela comunidade de acolher um messianismo de ação, de trabalho e de envolvimento na construção de um reino melhor. Afinal, teriam que sair do comodismo de uma vida fácil e fatalista.

            Se Jesus aparecesse de maneira similar, em tantos dos nossos espaços religiosos, provavelmente encontraria ambiente parecido com o da sua terra natal. Ali já não se desejava contribuir para o bem da comunidade, mas, torna-se lugar de grande afluência para obtenção de vantagens pessoais. A recusa diante das possibilidades de conversão torna-se também impossibilidade de perceber as interpelações dos sinais do Reino, porque o foco da fé fica restrito somente aos interesses particulares.

Ancianidade



Velho, caduco e esclerosado,
Já não interessa ao mercado,
E, solitário, fica a se condoer,
Sem forças para se remover.

Pouco interessa seu passado,
Nem seu humanitário legado,
E, dos muitos ou poucos bens,
Restam-lhe só parcos vinténs.

A narrativa das muitas glórias,
E a memória de belas vitórias,
Já exauridas pelas novidades,
 Esvaem-se como insanidades.

Longas noites mal dormidas,
Despertam horas denegridas,
Em que o desejo de morrer,
Vira luz no cotidiano sofrer.

Dos filhos gerados com amor,
Nem sempre emerge o ardor,

De uma presença alentadora,
E eficaz comunhão redentora.

Elogios de alguns bajuladores,
Se não renovam os pendores,
Pelo menos amenizam agruras,
E reativam as antigas ternuras.



<center>INDIFERENÇA SISUDA</center>

    O entorno da vida cotidiana, Virou o veneno que dimana, A endurecer os sentimentos, Perante humanos proventos.   Cumplicidad...