quinta-feira, 8 de maio de 2014

Portas que fecham e que abrem



            Nas lidas de um dia normal, com certeza, cruzamos por muitas portas e, muitas vezes pelas mesmas portas. Umas estão fechadas e precisam ser abertas; outras estão abertas e convém que sejam fechadas por razões muito variadas. Por vezes para evitar sequelas do vento; em outras, para não expor a intimidade, ou para assegurar a privacidade.
            Como as portas da residência ou da área de serviço separam mundos, é natural que nem sempre devam estar abertas, e, é igualmente evidente que nem sempre precisam estar fechadas. Porém há muitas portas que se abrem, não para acolher e nem para desfrutar da condição “nidícola” do espaço doméstico. Há quem entra à força e, se uns tendem a entrar para efetuar roubos, outros procuram entrar, mesmo sem convite ou autorização, para invadir a privacidade.
            Muito amplo também é o mundo das portas que se abrem efusivamente apenas para alguns partidários de alguma ideologia ou de algum interesse precípuo e se fecham escancaradamente a todos quantos não interessam. Atrás desta ambiguidade das portas estão pessoas ou controles remotos que agem de formas a permitir cruzamento somente de pessoas conhecidas e selecionadas.
            Para o povo bíblico do tempo do exílio na Babilônia a triste experiência foi a de constatar que para ele já não existia nenhuma porta aberta. Entre os sentimentos de culpa diante dos percursos que o levou a tal fatalidade e a revolta diante da absoluta inviabilidade de pelo menos vislumbrar a possibilidade de que alguma porta pudesse abrir-se, o profeta Ezequiel se esmerava muito na insistência de que pelo menos Deus representava uma porta aberta, através da qual poderiam voltar a sonhar e articular um caminho de libertação.
            Mais tarde, na fase primitiva do cristianismo, quando outras dificuldades desanimavam os discípulos de Jesus Cristo, o evangelista São João lhes apontou uma rica imagem do significado de Jesus Cristo: primeiramente assegurou que Jesus representava um curral seguro contra ladrões e salteadores, mas que, simultaneamente, representava a porta de saída do curral e ele mesmo conduziria as ovelhas para outros lugares de fartas pastagens.
            Por conseguinte, fica também para nós a evidente dedução de que o jeito de Cristo evita que nos tornemos salteadores ou ladrões. Pela porta do seu caminho advém uma segurança, desde que se ouça sua voz, e, não a de estranhos que apenas abrem portas para manipulações interesseiras. Na sua alegoria somos igualmente interpelados a avaliar tanto a voz que mais ouvimos quanto modos de agir para oferecer segurança a quem vem ao nosso encontro e que também deseja o caminho seguro das fertilidades que a mãe terra produz.
            Na imagem das boas pastagens, com certeza, nós as desejamos ardentemente, mas, nos últimos tempos somos induzidos a desejá-las somente para nós mesmos e nos tornamos insensíveis aos outros que também anseiam por alguma participação. Ao mesmo tempo, constitui uma interpelação para não ficarmos acomodados na mesmice do cotidiano das rotineiras coisas e seguranças.
 Há muitas outras possíveis pastagens, também na qualidade de fé das comunidades cristãs. Da mesma forma, existem outras possibilidades alternativas aos detentores do poder que se pensam os únicos salvadores do povo. O triste espetáculo de tantos fatos de corrupção indica que se aproximam muito mais dos salteadores do que dos seguros condutores, capazes de levar para fora do redil das obsoletas barganhas interesseiras e dominadoras.




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