quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Consumo


Em passado não muito distante,
Predominava na vida a homogeneidade,
E, tudo quanto fosse regular e constante,
Desfrutava da melhor idoneidade.

Sobretudo nos ambientes rurais,
Eventual quebra do ritmo de vida,
Somente ocorria nas festas e funerais,
Pois, era diuturna a cotidiana lida.

O mapeamento do tempo e do espaço,
Dependia mais da orientação religiosa,
Do que do civil compasso,
Visto como tentação perigosa.

Procedente do quadro religioso,
A divisão do tempo sagrado e profano,
Definia os lugares santos e os do capeta perigoso,
E alertava sobre os riscos de possível engano.

Este modo coeso e uniforme,
Rico em reciprocidade e partilha,
Conferia à cordialidade um peso enorme,
Como sendo de Deus a mais excelsa maravilha.

O migracionismo para as cidades,
Relegou as memórias do passado,
E envolveu gente de todas as idades,
Para se adequar ao sistema do mercado.

O novo ditame do sistema,
Abriu o horizonte das etiquetas;
Relegou a cordialidade do antigo esquema,
E pautou o novo valor das urbanas silhuetas.

Pelo consumo deixou todos obcecados,
Na condução das ilimitadas fantasias;
Acabou deixando a todos abarrotados,
De coisas fúteis e quinquilharias.

Na avidez da vontade sem limites,
O sagrado e o profano foram colocados à venda;
E, entraram no rol dos sedutores convites,
Da compra, do desfrute e da renda.

No rápido descredenciamento da milenar função social,
De agregar pessoas para rezar em lugares santos,
E de cimentar através das comunidades a orientação espiritual,
Ficou a religião restrita à prateleira para subjetivos desencantos.

Na heterogeneidade das cores, luzes e espaços da cidade,
Bem como das casas, das ruas, das avenidas e das velocidades,
Tornou-se secundária a pertença a uma comunidade,
Pois ocupa seu lugar o consumo das novidades.

Assim, perderam as festas a memória dos santos,
Para serem promovidas em todos os dias, nos lugares os mais diversos,
E, espalhadas até nos mais distantes recantos,
Nos profanos santuários se oferece comida, bebida e ébrios, até dos mais perversos.

No lugar dos momentos fortes e de religiosa comoção,
Das novenas, romarias e procissões,
No cultivo da ascese e da contemplação,
Impôs a cidade o valor do turismo, da praia e das “curtições”.

Assim, o histórico predomínio dos valores ético-morais,
Cedeu seu referencial para o corpo belo e malhado,
Mas a nova heterogeneidade da cidade nas suas ordens radicais,

Impõe nova homogeneidade do consumo inveterado.

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