quinta-feira, 31 de outubro de 2013

A decisão diante dos fatos trágicos



            Até os mais empenhados na busca de boa qualidade de vida e os que desejam viver intensamente as coisas novas e bonitas da vida, não se escapam da contingência de ter que lidar com perdas, com mágoas, com decepções imprevistas e com repercussões que abalam a vida. Aumenta também, cada dia mais, a necessidade de aprender a lidar com doenças graves, como câncer e com acidentes trágicos que mudam radicalmente a vida de indivíduos de um instante para outro. Enquanto que a vida destas pessoas estabelece um claro limiar entre o antes e o depois, são obrigadas a lidar com a nova situação, e, para sobreviver, não podem ficar lamentando as perdas do “antes” que desapareceu, mas precisam substituir a sensação desta perda e de vazio por uma positiva escolha de atitudes a serem tomadas diante da restrição que se impôs ao corpo.
            De fato, sem poder decisório, a vida dos fracassados se torna um tormento para muitas pessoas. No entanto, não precisamos andar muito para encontrar pessoas que revelam extraordinário poder decisório, e, estupenda capacidade de aceitar limitações irreversíveis, decorrentes de acidentes ou de extirpações para conter doenças malignas e deficiências graves. Ainda que repentinamente limitadas, estas pessoas conseguem tomar atitudes diante da vida e dar-lhe um sentido, de modos que se torne rica e cheia de muita satisfação. Equivale a dizer que o acidente quebrou o pescoço, e, mesmo na paralisia, não quebrou a vida. Descobrem razões para sentir-se bem e transformar os limites em algo genuinamente humano, peculiar e realizador.
            Mesmo quem não se vê diretamente envolvido por imprevistos graves e profundos, não está livre de ter que usar seu poder decisório diante de culpas, de dores e de sofrimentos, tanto pessoais quanto alheios. Isto indica que a vida pode, em quaisquer situações, tornar-se significativa. Depende do que se decide e do sentido que se dás aos sofrimentos e às limitações imprevistas. Esta escolha radical, segundo o psiquiatra austríaco Viktor Frankl, pode ser feita seguindo três grandes avenidas e todas elas podem levar à realização.
            A primeira avenida é a do trabalho, especialmente quando oportuniza possibilidades de criar e não se constitui em mera repetição de movimentos rotineiros e mecanizados como o de ter que desossar pelo menos três coxas de frango por minuto ao longo de todo expediente diário de serviço, tarefa cotidiana de muitos empregados da Sadia em Lucas do Rio Verde, MT.
            A segunda avenida é a de compartilhar a individualidade com alguém, isto é, uma relação de amor, mas entendido como sendo muito mais do que um relacionamento sexual.

            A terceira avenida é a de lidar com as doenças incuráveis e com as limitações profundas decorrentes de tragédias, acidentes ou da própria idade. Ao aceitar-se o condicionamento, na condição de que não se tem outro jeito para lidar, pode a vida, naquilo que ainda lhe é possível, ser transformada em significado profundo, até o último suspiro, para morrer dignamente. Mudam as oportunidades e as potencialidades, mas não muda a possibilidade de se estabelecer um sentido e profundo significado para a vida, como o de amar alguém, – de preferência muitas pessoas, - e agüentar honesta e corajosamente o sofrimento, com um estilo novo dado à própria existência. (Da entrevista de Viktor Frankl, no Canadá, sobre o tema: O Homem Vive. Trad. de Felipe Cherubin. Disponível em  http://www.endireitar.org/ )  

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