Nosso
momento histórico faz emergir uma inquietação profunda diante dos abusos
cometidos pelos que se proclamavam probos e bons homens, capazes de resolver
velhos e candentes problemas do país. De conversas e mentiras repetidas à
exaustão, ensejaram concluir que a maior parte da população é cega e nem terá
condição de enxergar o que eles, os mandantes sabiam fazer sob as aparências do
interesse público e coletivo.
Na
multiplicidade dos significados da cegueira, vemos que o da incapacidade visual
está bem relacionado a pessoas que tem visão normal e que conseguem ler e
interpretar o que visualizam, mas, não percebem a cegueira da sua tática de
controlar as pessoas pela condição da mendicância.
Os
proclamados condutores da grande massa cega, os governantes, falam e discursam
que captam com perspicácia o que o povo mais precisa, mas, pelo que
efetivamente fazem, conduzem seus passos e os atrelam aos seus interesses. Sua
cegueira é a de não saírem de sua maldade: enxergam somente algumas coisas para
seus interesses pessoais. Ao mesmo tempo, recusam-se a iluminar a vida sofrida a
fim de lhe propiciar direitos básicos. Querem que continuem mendigos. Aquilo
que enxergam no povo, torna-se, na verdade, o motivo de sua condenação.
O texto do
Evangelho de São João trata, no capítulo 9, como Jesus levou um cego a perceber
sua cegueira (não de vista) e aceitar uma luz para agir do jeito de Jesus
Cristo. No diálogo em torno da cegueira, quer-se saber do culpado do homem que
não enxerga. Jesus despistou esta conversa e mandou o cego lavar-se na piscina
de Siloé (que significa Enviado).
Socializado
para ser um mero mendigo, o cego causou reações e murmúrios quando retornou da
piscina e dizia que estava enxergando. Os que eram mesmo os cegos efetivos
(fariseus) quiseram, então, se interessar pelo causador da visão e simplesmente
não estavam dispostos a admitir que aquele vivente tivesse passado da condição
de cegueira para a de enxergar. Inconformados, os fariseus ameaçaram expulsar
da cidade quem declarasse Jesus como autor da mudança na vida naquele cego.
Pior ainda,
começaram a denegrir a imagem de Jesus. No entanto, não queriam que o cego
enxergasse e passaram a acusá-lo de que de que era seguidor de Jesus Cristo,
mas, na prática, o cego revelou mais bom-senso e perspicácia do que os fariseus,
que presumiam enxergar bem para conduzir os cegos “mendigos”.
Afinal, se muitos cegos de nascença viessem a
manifestar a mesma mudança daquele que começou a enxergar, eles, os fariseus, é
que teriam que reconhecer sua cegueira. Optaram pelo mais fácil: ao constatarem
que aquele antigo cego fez um ato de fé em Jesus (“Eu creio Senhor”)
mandaram-no embora.
Alguns
fariseus, pelo menos, se inquietaram e se perguntaram se eles, afinal, também
estariam cegos! Jesus lhes replicou que por acharem que enxergavam bem é que estavam
permanecendo no pecado.
Transparece,
no episódio, uma interessante pedagogia usada por Jesus Cristo: de uma cegueira
de fé, que culminou numa importante proclamação de fé! O processo da cura
aconteceu no confronto com a adversidade, criada pelos que presumiam enxergar
mais e melhor do que os outros da sociedade.
O episódio certamente constitui um indicativo
metodológico para indicar como se pode passar de uma situação meramente
materialista e humana, para uma fé em torno do modo como Jesus iluminava a
vida. Tal processo de passagem requer confrontação que amadurece paulatinamente;
e, é muito diferente dos milagres instantâneos, que, na verdade apenas atrelam
a formalismos de quem deseja manter muitos “cegos” sob seu controle.
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