Na
aldeia do Morocó o ponto mais apropriado para fornecer e captar informações e
presumidas novidades era o do bar do seu Zé Bigode. Além dos jogos de sinuca e
de baralho, era também o ponto ideal para colocar as fofocas em dia. Quem nunca
faltava neste círculo de cruzamento de informações, era o Pacheco, conhecido pela
repetição de sua expressão costumeira. Toda vez que alguém falava de algo
sinistro ou de alguma ocorrência grave, Pacheco respondia:
- Podia ter sido pior!
De
tanto ouvir Pacheco dar a mesma resposta e uma justificativa nem sempre
convincente, os amigos dele resolveram fazer uma aposta.
O
senhor Benedito Cruz apostou, com os demais, que ele iria contar uma história e
que o Pacheco não iria repetir sua costumeira frase de que “podia ter sido
pior!”. Tudo foi combinado e com os valores em cachaça a serem pagos, bem como o
dia marcado para a aposta. No horário combinado, todos já aguardavam a chegada
do Pacheco, curiosos a respeito do que ele iria responder diante da história que
Benedito Cruz iria dramatizar.
Mal
o Pacheco chegou ao grupo, e Benedito Cruz com a fisionomia aparentemente
transtornada e, sob um exagero na expressão do seu nervosismo dissimulado, começou
a falar:
- Gente, o que vou contar para vocês, eu nunca
poderia esperar da vida. Acabei de matar meu melhor amigo! Já estava
desconfiando um pouco da minha esposa, mas, há pouco, quando voltei daqui do
bar e cheguei à minha casa, me pareceu que tinha gente estranha. Entrei pela
porta e já agarrei uma ripa de um metro e meio usada para trancar a porta. Fui
entrando quieto no rumo do quarto e, assim que entrei, vi meu amigo Pedro, em
intimidade com minha esposa.
- Com voz trêmula, Benedito Cruz falou: Dei duas
pauladas certeiras na cabeça e o deixei morto, lá na cama! Benedito Cruz,
encenando um choro desesperado, solicitou ajuda.
Foi
o momento em que Pacheco já soltou sua costumeira frase:
- Poderia ter sido pior!
- Alguém logo retrucou: mas como? Benedito matou
seu amigo, como é possível você ainda dizer que poderia ter sido pior?
Pacheco,
sem maiores rodeios, forneceu sua explicação hermenêutica:
-
Pois é! Se tivesse sido ontem, o morto seria eu!
Episódio
mais ou menos similar vem se repetindo num outro círculo, o da imensidão de
governantes corruptos em nosso país, que também produzem encenações,
dramatizações sobre o que poderia ter sido pior, mas, em meio aos disfarces, surgem
incontáveis “Pachecos” que acabam revelando suas traições ao povo brasileiro,
através de hermenêuticas repetidas à exaustão, e que, no entanto, além de não
convencer, ainda revelam os meandros da sua perversidade.
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