Quando alguém deixa transparecer que
as marcas do seu passado impõem mais tristeza do que alegria e quando
sentimentos sorumbáticos e taciturnos se sobrepõem às recordações
satisfatórias, e ainda, quando a melancolia move feições mais carrancudas do
que cordiais e acolhedoras, tende-se a concluir que se trata de algo mal
resolvido na sua individualidade.
As situações macambúzias também são
atribuídas aos traços familiares, pois se costuma reforçar a argumentação de
que os traços tristes ou anti-sociais indicam ancestralidade de predisposições
genéticas e de condições biológicas. Provavelmente, sequer se desconfia que um
estado psicológico individual manifeste um inapelável caráter social.
Para a sociedade torna-se, evidentemente,
muito confortável a conclusão de que eventuais perturbações pessoais decorram
estritamente da subjetividade destas pessoas e que a causa mais remota está na
sua ancestralidade de defeitos genéticos ou de predisposição biológica para
tais traços. Nesta condição, as pessoas macambúzias vão encontrar somente nelas
mesmas as causas e a evidente tarefa: elas mesmas precisam achar solução para
os seus problemas e não devem molestar o ambiente social que,
impreterivelmente, continua numa imperturbável passividade ou “atarraxia”.
Se, entretanto, acreditamos que na
prática psicológica individual subjaz um caráter social, significa deduzir que
para a cura das situações macambúzias, faz-se literalmente necessária uma
mudança nas relações sociais. Pensada como algo isolado acima do bem e do mal
dos indivíduos, a sociedade se desincumbe da sua impreterível necessidade de
conversão e delega toda culpa aos indivíduos. Portanto, se indivíduos dependem
do caráter socialmente construído, dependem de alterações sociais para se
tornarem diferentes. Este modo de ver perturbações individuais estreitamente
conectados ao ambiente social significa que o ambiente social é fundamental
para a melhoria dos indivíduos. As implicações são maiores do que de primeira
vista se possa pensar. Basta o exemplo das lidas policiais: é muito fácil
rotular uma pessoa de elemento delinqüente ou de mau elemento, quando a polícia
procede exatamente com estas características. Significa, portanto, que também a
polícia precisa mudar seu modo de agir. O exemplo se aplica igualmente ao modo
de proceder dos pais, das autoridades locais e das muitas outras instâncias da
vida social.
Viktor Frankl destaca,
figurativamente, três avenidas importantes para conduzir à realização porque a
vida pode ser significativa sob quaisquer condições: a) Trabalho –
especialmente aquele que permite criação e não mera reprodução mecânica das
mesmas tarefas e funções; b) Amor compartilhado com alguém em sua
individualidade, algo muito mais amplo do que mera sexualidade; c) Doenças
incuráveis – afetam a dimensão mais profunda do ser e permitem ativar a
capacidade de transformar a tragédia de formas a tornar a vida significativa
até no último suspiro, isto, quando não existe outro jeito.[1]
[1] Em entrevista sobre o tema: O Homem vive.
Tradução de Felipe Cherubin. (Disponível em: http://logotherapy.univie.ac.at/e/indexe.html
) “O que é transitório são apenas as
potencialidades; são apenas as oportunidades: para realizar um objetivo na
vida, seja por fazer algo, seja por amar alguém, seja por agüentar corajosa e
honestamente um sofrimento, que você não tem como evitar e até mesmo enfrentar
a sua morte de uma forma dignificada, enfim, com seu próprio estilo.” (Idem,
ibidem)
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