É comum
ouvir-se que “lei é lei, e que existe para ser cumprida”! No entanto, cabe uma
inquirição: quem faz a lei e para favorecer a quem? À parte dos interesses, uma
lei tende a ser implantada sobre uma experiência anterior ou alheia, que provou
certa eficácia. Neste contexto, pode uma lei ser promulgada quando já se
encontra caduca diante da inovação das relações ou dos acontecimentos. Assim, o
assunto não enseja nem uma exagerada absolutização das regras vigentes, mas,
tampouco uma absoluta desvalorização.
O que
constatamos no dia-a-dia é que precisamos de regras para nos organizar
adequadamente diante do que desejamos. Quer sejam estabelecidas como leis,
princípios, decretos, pareceres ou normas, nós carecemos, até no nível pessoal,
de balizas para nos organizar adequadamente, desde programa de sono, limites na
alimentação, regras de bons tratos, pois, sem a dimensão normativa, a vida se
torna literalmente desorganizada e inviável.
Embora não
tenhamos a liberdade de participar e de aprovar todas as leis que regem a
sociedade, temos uma fagulha de liberdade para nos situar diante das regras
oficialmente estabelecidas. É evidente que muitas constituem interesses
favoráveis a elites privilegiadas. Outras são impostas de forma autoritária e
outras são inócuas diante dos problemas existentes. O difícil é perceber quando
uma lei se torna prejudicial para setores ou categorias da sociedade.
Podemos,
pois, aprender dos ensinamentos de Jesus Cristo, segundo Mt 5,17-37, que a lei,
tende a se direcionar para o formalismo (observâncias exteriores e de fachada),
e, neste caso, uma lei pode revelar-se altamente prejudicial à organização
humana. Portanto, mais do que insinuar abolição, ou estímulo à observância da
lei, Jesus deu a entender que a lei deve perpassar o âmago das pessoas, a fim
de constituir-se em verdadeira fonte amorosa, e não uma prática exterior para
encobrir corrupções e falcatruas de toda natureza, e, nem com a maldade de se
isentar através de hermenêuticas de interpretação ou das entrelinhas do não
estabelecido.
Deste modo,
pode uma pessoa ser rigorosa observadora de leis e, com elas, tornar-se
altamente injusta. Jesus falava da observância do espírito da lei, pois, a
simples e cega observância da lei pela lei, pode constituir-se num deplorável
instrumento de exploração injusta.
Nas regras
religiosas vemos algo deplorável alastrar-se através do fundamentalismo que vem
atingindo vastos setores da Igreja católica e as leva à observância rígida e
minuciosa de regras suplantadas pelo tempo, e tendem a criar um verdadeiro
inferno para a vida dos que desejam submeter através de seus discursos
legalistas e moralizantes.
Ao lado das
muitas outras dimensões da vida, a lei deve abrir luzes para acertos e
entendimentos, a fim de que o bem de Deus possa estabelecer-se, sem a esclerose
que faz das regras estabelecidas uma fonte de barganha para dominar, submeter e
humilhar outras pessoas.
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