quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Antolhos e cegueiras de fé



Como a fé não é um processo linear e nem necessariamente acumulativo, podem ocorrer muitas variações e oscilações nos efeitos e frutos da fé.
No tempo em que o transporte e as viagens dependiam muito de cavalos, descobriu-se um modo de evitar que os cavalos, enquanto andavam, pudessem se assustar com algum bicho ou sinal na beira da estrada. Para tanto, seus donos prendiam uma proteção de couro ao lado dos olhos dos cavalos, a fim de que vissem somente a linha reta para frente. É o que se chama de antolho, um empecilho para que o cavalo não tenha uma visão panorâmica do que se passa ao seu derredor.
Muitos orientadores de fé fazem algo similar com seus orientandos. Conduzem-nos com antolhos, psíquico-emocionais, que os fanatizam para fundamentalismos estreitos e radicais, e ainda, conduzem estas pessoas num processo de submissão para vulgares formalismos e exterioridades de rituais religiosos e ideológicos.
No Evangelho de Marcos (10,46-52) aparece uma bela ilustração de como Jesus lidou com cegos na fé: Bartimeu representa os discípulos da época e de nossos dias. Enquanto em cena anterior o evangelho descreve como Jesus agiu com outro cego, tão dependente e sem percepção da dimensão da fé, que foi levado por outras pessoas a Jesus para que o curasse. O peculiar do gesto de Jesus foi toma-lo pelo braço e levá-lo para fora da aldeia e dar-lhe uma atenção personalizada e o “cego” foi enxergando, gradualmente, mais e melhor.
Muitos cegos de fé, ainda hoje já nem sequer possuem autonomia para procurar redenção em Cristo e somente chegam a Ele através da mediação de outras pessoas. Outros, no entanto, mesmo com longa caminhada na fé sucumbem com a impossibilidade de perceber um caminho que realmente salva, porque os antolhos os desviaram para ideologias e para percepções muito limitadas e parciais da orientação apresentada por Cristo.
Apesar de lideranças religiosas se pensarem pessoas de muita fé, não conhecem quase nada de Jesus e, na verdade, se constituem em cegos que estão na beira do caminho. Gritam e berram suas expectativas por ajuda mágica, imediatista e isenta de quaisquer sofrimentos e de qualquer empenho pessoal. Desejam uma salvação messiânica que lhes propicie fama e domínio. Enfim, querem muito milagre e muita honra! Querem um triunfalismo, mas, seu agir se torna satânico, pois, dividem, separam e afastam.
Bartimeu, ao desvencilhar-se do manto, símbolo da sua compra de afeto e da cega submissão a um sistema escravizador, teve pelo menos uma intuição muito boa: desejava enxergar, porque se deu conta de que foi se tornando paulatinamente estreito e cego na organização da sua vida. Estava na beira do caminho...

O manto simboliza o antolho, mas, também simboliza a perda da consciência diante do processo consumista que insensibiliza e faz avançar na perda gradual de qualidade de vida. A resposta de Jesus a Bartimeu, certamente continua a mesma para os nossos dias: ande, que o desejo de enxergar mais e melhor nas motivações de fé, já estão salvando!

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