quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Dilemas do cotidiano



Uma das contingências da nossa condição humana – a de ter que fazer opções - envolve também outra característica: por mais que façamos escolhas, não podemos escolher tudo e nem todas as coisas. Isto indica uma evidência de que existe alguém muito mais amplo e mais capaz do que nós, de quem intuímos sinais a partir da sensibilização diante das grandezas que se misturam na fragilidade da nossa condição humana.
Na linguagem religiosa dizemos que são interpelações de um amor maior de Deus. Na vida diária, porém, relegamos facilmente esta dimensão: afinal, seguimos preceitos religiosos ou os de organismos meramente políticos?
A simples condição de escolha da autoridade presidencial do país já nos situa entre duas perspectivas antagônicas sob o aspecto dos projetos: opta-se por uma governança, presumidamente, para o bem do povo, ou o dos banqueiros e grupos de grande poder de barganha, insaciáveis na busca de ampliação dos seus bens? De acordo com o foco do olhar dos interesses, muda a escolha. Mas, a própria e inevitável escolha tem conseqüências: a quais ordens nos submetemos?
A maldade que se esconde, e, que permeia muitas escolhas desperta dilemas muito difíceis, além de dificultar as opções. Podemos imaginar a situação descrita por Mateus 22,15-21, na qual Jesus se viu na fatalidade de posicionar-se e escolher entre duas alternativas, mas, qualquer uma delas o levaria à morte. A pergunta aparentemente ingênua, mas, - muito maldosa, - que lhe foi dirigida a respeito da validade de pagar tributo a César, se coloca de maneira bastante similar às pessoas de fé: a que domínio de ordens nos sujeitamos na organização da vida?
Os judeus estavam sob o domínio do imperador César Augusto (augusto significa aquele que está acima dos deuses) que lhes exigia pagar pesados impostos a Roma. Dizer algo contra o tal imposto, constituiria insubmissão, sujeita a prisão e morte. Por outro lado, as raízes históricas e religiosas do povo de Israel indicavam que Deus deveria reger a vida do povo e não um arrogante e pretensioso imperador. Na verdade, Jesus remeteu os interlocutores para uma questão mais profunda: pode uma autoridade política usurpar o lugar de Deus?
Em última instância, o que estava representando a cega submissão ao imperador romano? Nada mais do que idolatria a alguém que se colocou no lugar de Deus. César chegou a exigir alteração do calendário anual a fim de que um mês – agosto (Augusto) que ainda hoje persiste - reverenciasse a sua condição divina.
Ao responder que convinha dar a Deus o que é de Deus, Jesus não estava insinuando que também convinha dar pelo menos uma esmolinha para Deus, já que o pagamento do imposto ia para César. Em outras palavras, quando damos a Deus o que é de Deus, não precisamos submeter-nos a vis idolatrias dos que dizem salvar como se fossem deuses, mas, que agem apenas em função de seus interesses pessoais.
Nossos dias deixam-nos no mesmo dilema e numa dúvida crucial: o poder político é mesmo um serviço para o bem comum, de modos que a rica dádiva da natureza não seja usurpada por alguns poucos, em detrimento da maioria das pessoas humanas, bem como dos múltiplos sistemas e dos incontáveis outros modos de vida?
A indicação de dar a Deus o que é de Deus certamente nos ajuda a relativizar muitas idolatrias, estabelecidas no lugar de Deus, e que realmente não agem para o bem-estar de todos os cidadãos do país, e, muito menos do planeta.




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