terça-feira, 31 de dezembro de 2024

O HOMEM VALENTE DAS MELANCIAS

 

 

            A região do Rio Morocó, perto do Pacoval, no município de Santa Rita do Trivelato, MT, era conhecida pela valentia de onças, queixadas e sucuris. Com brejos e grandes matas nativas, era um santuário de muitos bichos. Pouca gente se arriscava a acampar na beira do rio ou, a fazer uma pescaria naquelas águas. Por lá, também existiam lavouras férteis e de muita produção agrícola, como a do seu Domingos.

            Seu “Mênego” nem era conhecido pelo seu nome de batismo, que era Domingos. Homensarão grande, corpulento, com quase dois metros de altura e pesando em torno de 110 quilos bem distribuídos, chamava atenção por toda parte, não só pelo tamanho e pela farta musculatura, mas, também, porque tratava bem seus cabelos pretos, longos e ondulados sobre os ombros. Além disso, usava sempre um chapéu de pano e barba comprida. Encaixava-se legitimamente no imaginário de um profeta. Conversava até pelos cotovelos e sabia engrandecer suas múltiplas aptidões. Era do tipo “Joãozinho que faz tudo”. Bom pedreiro, bom mecânico, bom pescador, bom agricultor e extraordinariamente generoso para ajudar em festas e promoções da comunidade. Aparentava uma idade de cinquenta anos.

            Num ano seu “Menego” planejou plantar uma enorme lavoura de melancia. Calculava, por toda parte onde ia, quanto esperava tirar de lucro, uma vez que naquela região, melancia e abacaxi, além de outras variadas frutas, rendiam muito e eram muito saborosas. Na medida que as melancias iniciaram a fase de amadurecimento, as conversas do seu “Mênego” se espalharam pela cidade e como ele era falastrão, comentava que lá ninguém iria roubar nenhuma melancia. E falava que seu rifle iria espalhar muito chumbo em cima de quem tentasse entrar na sua lavoura de melancia.

            A publicidade com ameaças a eventuais ladrões, despertou uma rapaziada malandra, para furtar algumas melancias e provar se aquele tamanho de um trator do “Mênego”, realmente seria tão valente no tiro. Combinaram fazer uma janta de polenta com passarinhada, prato que seu “Mênego” adorava como bom descendente de italiano.

            A tática funcionou, e, enquanto seu “Mênego” animado com a janta contava causos e falava de pescaria e caçadas, alguns do grupo foram na sua lavoura e roubaram em torno de dez melancias grandes e boas.

            Dias depois, seu “Mênego” constatou que haviam sido furtadas algumas melancias. Mandou confeccionar um painel bem grande com o letreiro em cor azul: Tem melancias envenenadas. A rapaziada não perdeu a oportunidade de acrescentar mais um capítulo ao enredo. Mandaram confeccionar outro painel com letras vermelhas e vistosas e a colocaram ao lado do outro painel: “As outras melancias também foram envenenadas”.

            Seu “Mênego” vasculhava e auscultava, durante dias, toda conversa para descobrir quem fez a arte, pois iria manda-los para a cova com seu rifle. Como não descobriu, entrou em depressão, porque seu lucro estimado virou em pesadelo: todas as melancias apodreceram na lavoura, uma vez que a eventualidade de ingestão daquelas melancias poderia ser fatal. Por outro lado, ninguém sabia se as melancias foram ou não foram envenenadas. Na dúvida, prevaleceu a segurança de não consumir melancia daquela lavoura.

            Com o enorme prejuízo, faltou até dinheiro para tratar a depressão, e, o seu “Mênego” ficou mais de ano sem sair de casa, num estranho lusco-fusco de desejar a morte e de querer achar um motivo para continuar vivo. Depois do longo período depressivo, virou pescador a andar sozinho com seu bem equipado barco pelo rio Teles Pires, sem mais ninguém dos velhos companheiros.

 

 

 

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