terça-feira, 31 de dezembro de 2024

O VOVÔ DORMINHOCO

 

 

            Ainda não muito avançado na idade, vovô Artur, resolveu parar com trabalho ao se aposentar. Era um daqueles que projetou a aposentadoria como tempo para não fazer mais nada. Levantava tarde, e quando não ocorria insistência explicita para trocar o pijama por outra roupa, passava o dia inteiro de pijama e achava bom.

Virou homem do sofá e da cadeira de balanço. Como era diabético e, como funcionário aposentado do Banco do Brasil, sempre teve vida estressante, resolveu virar um caseiro mórbido. Além de assistir TV, gostava de ler jornal, sentado comodamente na cadeira de balanço. Volta e meia pegava no sono, mas quando acordava, tinha um entretenimento especial: passar horas com o netinho Pedro.

Pedro era apaixonado pelo vô Artur. Na sintonia e simbiose de comunhão, o pequeno menino fazia acrobacias das mais estranhas no colo do vô. Tirava seus óculos, bagunçava seus cabelos e fazia de tudo para receber muita apreciação elogiosa. Certo dia, o velho adormeceu enquanto lia jornal, e o menino, curioso, mexerico, bagunçava a sala inteira. Sua mãe estava em outras lidas, pois, sabia que o vô cuidava muito bem do netinho.

No entanto, enquanto Artur cochilava, o nenê encheu a fralda e foi andando de um lada para outro. Talvez devido ao desconforto meteu a mão para dentro da fralda e a deixou suja de cocô. Queria ajuda do velho, mas o velho estava dormindo. Subiu no colo dele, mexeu e futricou para todo lado, e acabou passando a mão suja de cocô no bigode do velho.

Artur, quando se acordou, já não viu o nenê, - pois a mãe o levara para a devida limpeza, - sentiu um estranho cheiro de cocô. Desconfiou que deveria ter acontecido alguma incontinência e foi rápido para o banheiro. Baixou as calças e fez uma criteriosa observação, mas, constatou que estava tudo na melhor assepsia, uma vez que tinha tomado banho caprichado ao levantar. Voltou para a sala, e continuou a sentir o mesmo cheiro. Foi, então para a janela, abriu-a, e, de fora, vinha o mesmíssimo cheiro. Inquieto, foi para o outro lado da sala e abriu a porta. Saiu, e nada havia esvanecido aquele estranho odor de cocô. Foi mais uma vez numa segunda janela, e, o ar que ali inalava era ar todo fedido de cocô humano. Foi então para a cozinha e falou enfaticamente para sua esposa: mulher, deixa dizer-lhe uma coisa grave: Andaram fazendo cocô no mundo!

Um bigode de velho pode enganar as certeiras interpretações do olfato e desviar a hermenêutica interpretativa dos acontecimentos.

O HOMEM VALENTE DAS MELANCIAS

 

 

            A região do Rio Morocó, perto do Pacoval, no município de Santa Rita do Trivelato, MT, era conhecida pela valentia de onças, queixadas e sucuris. Com brejos e grandes matas nativas, era um santuário de muitos bichos. Pouca gente se arriscava a acampar na beira do rio ou, a fazer uma pescaria naquelas águas. Por lá, também existiam lavouras férteis e de muita produção agrícola, como a do seu Domingos.

            Seu “Mênego” nem era conhecido pelo seu nome de batismo, que era Domingos. Homensarão grande, corpulento, com quase dois metros de altura e pesando em torno de 110 quilos bem distribuídos, chamava atenção por toda parte, não só pelo tamanho e pela farta musculatura, mas, também, porque tratava bem seus cabelos pretos, longos e ondulados sobre os ombros. Além disso, usava sempre um chapéu de pano e barba comprida. Encaixava-se legitimamente no imaginário de um profeta. Conversava até pelos cotovelos e sabia engrandecer suas múltiplas aptidões. Era do tipo “Joãozinho que faz tudo”. Bom pedreiro, bom mecânico, bom pescador, bom agricultor e extraordinariamente generoso para ajudar em festas e promoções da comunidade. Aparentava uma idade de cinquenta anos.

            Num ano seu “Menego” planejou plantar uma enorme lavoura de melancia. Calculava, por toda parte onde ia, quanto esperava tirar de lucro, uma vez que naquela região, melancia e abacaxi, além de outras variadas frutas, rendiam muito e eram muito saborosas. Na medida que as melancias iniciaram a fase de amadurecimento, as conversas do seu “Mênego” se espalharam pela cidade e como ele era falastrão, comentava que lá ninguém iria roubar nenhuma melancia. E falava que seu rifle iria espalhar muito chumbo em cima de quem tentasse entrar na sua lavoura de melancia.

            A publicidade com ameaças a eventuais ladrões, despertou uma rapaziada malandra, para furtar algumas melancias e provar se aquele tamanho de um trator do “Mênego”, realmente seria tão valente no tiro. Combinaram fazer uma janta de polenta com passarinhada, prato que seu “Mênego” adorava como bom descendente de italiano.

            A tática funcionou, e, enquanto seu “Mênego” animado com a janta contava causos e falava de pescaria e caçadas, alguns do grupo foram na sua lavoura e roubaram em torno de dez melancias grandes e boas.

            Dias depois, seu “Mênego” constatou que haviam sido furtadas algumas melancias. Mandou confeccionar um painel bem grande com o letreiro em cor azul: Tem melancias envenenadas. A rapaziada não perdeu a oportunidade de acrescentar mais um capítulo ao enredo. Mandaram confeccionar outro painel com letras vermelhas e vistosas e a colocaram ao lado do outro painel: “As outras melancias também foram envenenadas”.

            Seu “Mênego” vasculhava e auscultava, durante dias, toda conversa para descobrir quem fez a arte, pois iria manda-los para a cova com seu rifle. Como não descobriu, entrou em depressão, porque seu lucro estimado virou em pesadelo: todas as melancias apodreceram na lavoura, uma vez que a eventualidade de ingestão daquelas melancias poderia ser fatal. Por outro lado, ninguém sabia se as melancias foram ou não foram envenenadas. Na dúvida, prevaleceu a segurança de não consumir melancia daquela lavoura.

            Com o enorme prejuízo, faltou até dinheiro para tratar a depressão, e, o seu “Mênego” ficou mais de ano sem sair de casa, num estranho lusco-fusco de desejar a morte e de querer achar um motivo para continuar vivo. Depois do longo período depressivo, virou pescador a andar sozinho com seu bem equipado barco pelo rio Teles Pires, sem mais ninguém dos velhos companheiros.

 

 

 

sábado, 28 de dezembro de 2024

O CAÇADOR DE PEDRAS PRECIOSAS


 

            Com a ambição cultivada de ficar rico com venda de pedras preciosas, as conversas sobre velhos que esconderam algum tesouro começaram a despertar curiosos e interessados.

            Na beira do Rio Morocó, em Santa Rita do Trivelato, no Mato Grosso, a vizinhança lembrava o velho Tomé e dizia-se que ele tinha enterrado uma panela de barro com pedras preciosas e muito ouro.

            As conversas foram criando enredos e, de repente o neto do velho Tomé começou a sonhar com o possível acesso às supostas preciosidades enterradas. Os vizinhos, pensando em poder haurir, pelo menos uma pequena partilha do eventual achado, animaram o neto, apelidado de Fiuca, a fazer uma sondagem. Comentaram que o Pedro Mané havia adquirido um sensor para localizar pedras preciosas.

            Fiuca foi até Pedro Mané para pedir-lhe uma verificação de possíveis minérios de valor, e, este como andava vibrante com a possibilidade de também ficar muito rico, combinou para ir lá, no dia seguinte.

            Assim que o sol começou a despontar, estavam ali, Fiuca e alguns vizinhos, esperando Pedro Mané. Sem demora, apareceu numa velha Kombi e a encostou no pátio, ao lado do velho galpão. Escancarou as portas da Kombi e puxou para fora aquele trambolho cheio de fios e aparentando algo bem sofisticado e misterioso. Não andou três metros e aquele aparelho começou a emitir sinais com sons estranhos e luzinhas vermelhas piscando. Na medida que chegou mais perto do velho galpão, estes sinais passaram a aumentar de intensidade e o nível mais alto se manifestava ao redor do poste de aroeira, com mais de um metro de grossura, e, alguém já sugeriu que deve ter sido ali, ao lado do cepo, que o velho enterrou sua panela. A expectativa tornou-se animadora e vibrante.

            Entusiasmados, começaram a escavar com picareta e enxadão, mas, depois de mais de duas horas, já estavam cansados e resolveram chamar o homem da retroescavadeira. Veio rápido e começou a alargar a cova e a aprofundá-la até o limite possível de três metros de profundidade. Muita terra removida, ciscada, e observada por muitos olhos, que nada identificaram além do normal daquele solo. O homem da sonda, a cada pouco acionava seu aparelho e este aumentava os sinais na medida que se aproximava do poste.

            Mais uma vez, uma voz de opinião elucidativa de outro vizinho despertou os ânimos. Achou que o velho deveria ter enterrado o ouro dentro do cepo. Resolveram escorar o galpão e extrair o cepo, pensando que ali deveria estar a fonte da riqueza, mas, nada foi constatado, mesmo com o cepo cortado em pequenas porções com motosserra. No entanto, no lugar do poste, no alto da imensa cova é que o sensor emitia sinais mais intensos e fortes.

            Foi então que um terceiro vizinho, curioso e desconfiado, entrou dentro do galpão para verificar se a suposta pipeta de preciosidades não estivesse escondida, bem no cantinho do galpão. Ao chegar ali, viu um tonel velho, quase cheio de cacarecos de ferro e ferramentas estragadas. Trouxeram o aparelho de sondagem e verificaram, - decepcionados, - que o sinalizador de metais reagiu frente a poucos pedaços de cobre que estavam no meio do ferro velho jogado no tambor. Além do desencanto, restou fechar a imensa cratera, arrumar outro cepo e custear as despesas de sondagem e serviço de máquina escavadeira.

            O sonho grande, alargado com fantasia exuberante, renderia apenas alguns reais em cobre. Assim, seguiu-se silêncio sobre riqueza fácil na beira do Rio Morocó. Fiuca, prostrado, teve que engolir seco o acalantado sonho de ficar rico com histórias contadas sobre seu avô.

 

quinta-feira, 26 de dezembro de 2024

RELIGIOSIDADE SEM DEUS

 


Da velha rigidez de ritos e orações,

Detalhistas para as pias execuções,

Esqueceu-se a mediação do vínculo,

Para venerar um trabalhado báculo.

 

Sem voz profética e evangelizadora,

A orientação espiritual promissora,

Não requer empenho na conversão,

Mas exercício isento de prostração.

 

Igrejas com donos de largo sucesso,

Desencadeiam o atraente processo,

Do consumo de imaginário religioso,

Suave, emotivo, meigo e auspicioso.

 

Exercícios de auto-ajuda para êxito,

Pressupõem mero motivo explícito,

Para apropriar avantajadas posses,

Na imagem irradiante das benesses.

 

A voz berrante não é a de salvação,

Mas grito de barganha por isenção,

A fim de que aumento patrimonial,

Configure bênção divina e celestial.

 

Na inusitada estetização religiosa,

Com a garantia de vida prodigiosa,

A venda do sucesso é assegurada,

Com garantia para pessoa isolada.

 

Mais que teologia da prosperidade,

É empreendedorismo sem lealdade,

Sob meta de controle e dominação,

Para desfrutar duma divina bênção.

 

Fé instrumentalizada para a política,

Pouco se importa com hermenêutica,

Mas, faz a chantagem para o sucesso,

E culpa o sujeito por eventual fracasso.

 

Nenhum apelo para amar, ou perdoar,

Nem para servir ou fraqueza superar,

Pois, poder da mente alcança o desejo,

Do pensamento positivo para lampejo.

 

Se sucesso depende apenas da vontade,

Ser cristão não requer pródiga atividade,

Mas ser fiel a dízimo e a dono da Igreja,

E aquilatar esperteza pelo que se almeja.

 

 

 

 

 

terça-feira, 24 de dezembro de 2024

PAPAI NOEL

 

 

O bispo Nicolau das sacolas,

Com suas lenhas e esmolas,

Nas noites escuras e gélidas,

Visitava pessoas famélicas.

 

Para ninguém morrer de frio,

Nem de fome em lar sombrio,

O santo enrolado em pelegos,

Fazia humanitários chamegos.

 

Da imagem associada ao natal,

Deste Cristo Jesus nada triunfal,

Reconheceu-se o despojamento,

Advindo como um divino alento.

 

Nos séculos de história natalina,

Acionou-se a melhor adrenalina,

Para prática dos gestos de Cristo,

Com o proceder muito benquisto.

 

No cultivo do desejo consumista,

Abriu-se uma moderna conquista:

De mudar o aniversário do Cristo,

Para firmar um estranho malvisto.

 

Anônimo, escondido na máscara,

Alimenta larga consciência avara,

Para justificar inaudito consumo,

Sem perpetrar solidário aprumo.

 

Quando o natal roubado de Cristo,

Não lembra seu mundo benquisto,

O esvaziamento do seu memorial,

Produz a festa dum vazio triunfal.

 

Bom para viciar criança bem nutrida,

Empanturra-la com coisa imerecida,

Leva a adorar o deus da comilança,

Dum imaginário pobre de bonança.

 

A estimulação de ofertar presentes,

Já não lembra as pessoas carentes,

Mas as da etiqueta de esnobação,

Para esnobar uma rica ostentação.

 

Sem demora, a festa de Papai Noel,

Vai mobilizar todo humano vergel,

Para que velhinho bem disfarçado,

Exerça simulacro de deus adorado.

 

 

 

 

 

 

terça-feira, 17 de dezembro de 2024

OUTRO MODO DE CONVERSAR?

 

 

No céu da minha esperança,

Vejo ruína de vetusta aliança,

Do Ethos europeu em queda,

Já desprovido para almoeda.

 

Forjado para a guerra e luta,

Aprendeu a adorar a labuta,

Para obter boa competência,

E hierarquia de precedência.

 

Feito máquina racional e ágil,

Apossa-se da condição frágil,

Para apropriação de recursos,

E justifica-los com discursos.

 

Foca o crescimento e poder,

E firma a verdade de exceder,

Sua lei absoluta da vantagem,

Para aplicar vasta chantagem.

 

Observa o risco em toda parte,

E como não partilha e reparte,

Apela, na força bruta e mortal,

Para ampliar o que lhe é vital.

 

Nada suporta de discordância,

Apelando sempre à violência,

Pois sair favorecido e vitorioso,

É topo do seu olhar orgulhoso.

 

Desejos altamente estimulados,

E difíceis de serem alcançados,

Criaram no monstro da guerra,

Prazer que a atividade encerra.

 

Nem intuição, nem outra noção,

Porque o controle de toda ação,

Rege conduta de emoções frias,

Para vencer com guerras bravias.

 

Subida de poder para subordinar,

Foca na competência para calcar,

Elevação na exitosa meritocracia,

De decaída honra na tecnocracia.

segunda-feira, 16 de dezembro de 2024

GÊNIOS AMOUCOS

 

 

Quando educação aponta para fúria,

E se constitui em mediação espúria,

Para alimentar os ódios ideológicos,

Eliminam-se os valores pedagógicos.

 

Pouco importa a cultura acumulada,

Nem mesmo a sabedoria encantada,

Mas, formatação de sujeitos rígidos,

De sentimentos enérgicos e frígidos.

 

Na pirâmide das estratificações sociais,

A ascensão depende de pontos cruciais,

Que ficam distantes da lealdade cordial,

E da honestidade para respeito exordial.

 

Importam músculos, marchas e destreza,

E rígidas posturas dominadoras de crueza,

Para submeter outros a interesse pessoal,

E firmar-se em superioridade exponencial.

 

Adora-se a idolatria de heróis vencedores,

Destes midiáticos e espertos espoliadores,

Feitos para serem adorados e consumidos,

E povoar mentes dos submissos enrustidos.

 

Educados para o pobre pensamento único,

Só aprendem a enxergar o ato antagônico,

Para mover-se na fúria zangada e homicida,

Que enaltece um gênio doido e desvairado,

A gerar confrontações de ódio exacerbado.

 

Nem hipótese de perder ou sair magoado,

Menos ainda, perdoar um ódio apregoado,

Pois apenas interessa o heroísmo vencedor,

Que com fúria se apresenta um dominador.

 

No lugar do respeito e da valiosa bondade,

Reina bajulação sem mínima reciprocidade,

Fitando mortalidade mais do que o desvelo,

E,  por isso, se espalha o adoentado modelo.

 

 

GÊNIOS AMOUCOS

 

 

Quando educação aponta para fúria,

E se constitui em mediação espúria,

Para alimentar os ódios ideológicos,

Eliminam-se os valores pedagógicos.

 

Pouco importa a cultura acumulada,

Nem mesmo a sabedoria encantada,

Mas, formatação de sujeitos rígidos,

De sentimentos enérgicos e frígidos.

 

Na pirâmide das estratificações sociais,

A ascensão depende de pontos cruciais,

Que ficam distantes da lealdade cordial,

E da honestidade para respeito exordial.

 

Importam músculos, marchas e destreza,

E rígidas posturas dominadoras de crueza,

Para submeter outros a interesse pessoal,

E firmar-se em superioridade exponencial.

 

Adora-se a idolatria de heróis vencedores,

Destes midiáticos e espertos espoliadores,

Feitos para serem adorados e consumidos,

E povoar mentes dos submissos enrustidos.

 

Educados para o pobre pensamento único,

Só aprendem a enxergar o ato antagônico,

Para mover-se na fúria zangada e homicida,

Que enaltece um gênio doido e desvairado,

A gerar confrontações de ódio exacerbado.

 

Nem hipótese de perder ou sair magoado,

Menos ainda, perdoar um ódio apregoado,

Pois apenas interessa o heroísmo vencedor,

Que com fúria se apresenta um dominador.

 

No lugar do respeito e da valiosa bondade,

Reina bajulação sem mínima reciprocidade,

Fitando mortalidade mais do que o desvelo,

E,  por isso, se espalha o adoentado modelo.

 

 

quinta-feira, 12 de dezembro de 2024

COMEDORES DE CÉREBRO

 

 

A ameba Naegleria Fowleri prospera,

Age no cérebro com força de quimera,

E produz meningoencefalite amebiana,

Com a voracidade compulsiva e tirana.

 

Vinda da água doce, seu habitat natural,

Encontra atraente caminho na via nasal,

Para alcançar o vasto reino de consumo,

Desta massa encefálica sem desaprumo.

 

Outro processo similar a comer cérebro,

Que o deixa delimitado e sem requebro,

Constitui o da atual educação espartana,

E que produz uma deficiência doidivana.

 

A antiga Atenas conciliava corpo e mente,

Já a espartana apontava o corpo valente,

Da educação militarista rígida e rigorosa,

Para suposta atividade guerreira gloriosa.

 

Ainda que almejasse a boa convivência,

Fitava a coragem, disciplina e violência,

Capaz de defender interesse de Esparta,

Com lealdade às regras da ordem farta.

 

Boa suposição de espírito comunitário,

Movia-se por um pensamento unitário,

Do “nós” contra adversários e inimigos,

E para eles, aplicação de duros castigos.

 

Caráter militarista da ação educadora,

Fazia cérebros visar ação norteadora,

Para perseguir e eliminar os inimigos,

E sempre proteger afeiçoados amigos.

 

Aqueles valores culturais tão antigos,

Cultivavam cérebros ocos e postigos,

Do ideal único do matar e do morrer,

Para seus chefes militares enaltecer.

 

Sob o Ethos do homem bom soldado,

E da mulher parideira para amoldado,

Esvaiu-se o elã da dignidade humana,

Para fruir da cordialidade que irmana.

 

Enquanto o ideal nobre é ser soldado,

Inútil é sonhar com mundo bem dado,

Onde a cortesia com a alegre emoção,

Dão gosto para respeito em expansão.

 

 

quarta-feira, 11 de dezembro de 2024

CÉREBROS PODRES

 

 

“Brain rot”, nova doença declarada,

Dum modismo de doença execrada,

Refere-se à uma podridão cerebral,

Que degrada a capacidade mental.

 

Decorrente do consumo compulsivo,

De conteúdo fútil do meio televisivo,

Acomoda à passiva e resignada visão,

De engolir o veiculado pela televisão.

 

Sem consciência crítica e nem seletiva,

Passa-se o tempo na servidão coletiva,

De pressupor que o mundo informado,

É o real para o objetivo e bom legado.

 

No bombardeio exaustivo de imagens,

Cortado o tempo para avaliar miragens,

Aceita-se artística produção que distrai,

E na cotidianidade do real, tudo abstrai.

 

Viver o mundo imaginário produzido,

Na convicção de argumento induzido,

Faz do mundo fantasioso e imagético,

Um cotidiano real, nada peripatético.

 

Embora programa feito para distrair,

Prende atenção sem poder discernir,

Que outras atividades na vida efetiva,

Possam alargar a razão intersubjetiva.

 

No assistir sentado ou deitado no sofá,

Engendra-se uma tonturinha de gaiofá,

Teor alcoólico e anestésico que apaga,

E simula gestos de um amor que afaga.

 

E quando bate a ansiedade com o tédio,

O cérebro indica bom e santo remédio:

Continuar atrelado na imagem colorida,

Para acalmar autossugestão esbaforida.

 

Na larga podridão cerebral ambulante,

Nada importa qualquer regra edificante,

Mas, hábito viciado de consumo calado,

De um mundo feito para ser controlado.

 

 

 

 

FESTA DE ÍNDIO

 

 

            Os índios Bakairi, com cerca de mil e poucos membros estabelecidos nos municípios de Paranatinga, Planalto da Serra e Nobres, no Mato Grosso, são muito cordiais e festivos. Eram muito elogiados pelos fazendeiros e agricultores da região devido ao desvelo na lida de máquinas agrícolas. Cuidadosos no plantio e na colheita, dizia-se também que eram muito mais zelosos do que outros peões. 

            Os Bakairi da Aldeia de Nobres, quando anunciavam uma festa e matavam um ou dois bois para serem assados, convidavam todos quantos quisessem chegar para a festa.

Não tinha ingresso antecipado, nem taxa de refeição ou ficha para ser comprada e, menos ainda, hora marcada para o fim da festa. Tudo dependia de quantos viessem para a festa. Esta iniciava com os primeiros espetos assados e encerrava quando alguém pegava o último pedaço de carne para comer.

Esta gratuidade parecia algo muito estranho para festas das raças brancas, descendentes de europeus, pois, eram movidas para fazer festa a fim de obter bons e vistosos lucros. Mesmo que muitos mantimentos fossem doados, cobravam acima do custo normal nas vendas para que sobrasse mais dinheiro no saldo final da festa. Para eles, uma festa era apreciada pelo lucro obtido, e que, geralmente, era investido em reformas e melhorias nos salões das festas. E, sempre faltava algo para ser modificado ou melhorado a fim de permitir que o local fosse atraente e facilitasse a chegada de levas cada vez maiores de pessoas para participar das festas.

Assim, festas, mesmo em homenagem a santos e santas padroeiras, perderam a dimensão antropológica da festa, da gratuidade e, praticamente, se esvaziaram da grandeza da exuberância e do transbordamento, componentes não compráveis e que são decorrência natural da festa. A festa gratuita, como a de surpresa para um aniversariante, requer pouca coisa para produzir exuberância e transbordamento e que, de graça, faz um bem enorme para a vida de quem participa da festa. Infelizmente, um processo histórico levou as festas à imitação dos negócios capitalistas: precisam proporcionar bons e polpudos lucros.

Não importa a embriaguez que causam, os vícios alimentados, nem prejuízo à saúde, nem, tampouco, brigas decorrentes do excesso de bebida com comilança. Festa virou sinônimo de consumo e de excesso. É o momento para empanturrar-se em troca do que se pagou. Como a lei implícita é a de levar vantagem, o retorno da festa é caracterizado pelo mau humor. Em vez do esquecimento das dificuldades e contratempos para intuir que a vida, apesar disso, pode ser melhor do que foi antes, leva a remoer o evento pelo tédio e pela ruminação das mágoas.

A aldeia dos Bakairi, do município de Nobres, faz divisa com a comunidade católica do Pacoval, da paróquia Santa Rita, de Santa Rita do Trivelato, no Mato Grosso.

 Toda vez que esta comunidade do Pacoval organizava uma festa, surgia um desconforto para os organizadores. Apareciam uma ou duas caminhonetes Hilux, empinadas com quinze a vinte índios em cima, para participar da festa. Chegavam alegres e animados, informando que queriam dar um apoio para a festa. Surgia, então, um dilema cruel para os festeiros, pois, para os índios Bakairi, participar da festa com um apoio, significava comer e beber sem pagar um centavo. Para eles, festa sempre é gratuita e, na sua concepção de festa, seria impensável pagar pelo consumo de churrasco e cerveja. Isto já nem seria festa!

Ao especificarem quanto queriam de carne e de cerveja para colaborar na festa, recebiam uma certa quantidade de espetos de churrasco e umas caixas de latinhas de cerveja. Como eram bons de garfo, ao terminarem a ingestão do que haviam recebido, voltavam, numa comitiva, para dizer que queriam dar ainda mais apoio para a festa e pediam repetição da quantia recebida.

O desconforto da proposta de mais apoio, levava os organizadores da festa a informar que não tinham mais nada. A mentira, mal dissuadida, visava não baixar o lucro da festa. Os índios, então, - como a festa tinha terminado, - empinavam ainda mais as caminhonetes com peso ampliado, e voltavam contentes para casa.

terça-feira, 10 de dezembro de 2024

PODERES MENDAZES

 

 

Mentiras cada dia mais difundidas,

Com ardilosas ameaças e medidas,

Cheias de apelações enganadoras,

Alcançam persuasões arrasadoras.

 

Na elevação deste falso patamar,

Importa astúcia para desinformar,

E ardilosa malandragem para fruir,

Privilégios com as táticas de arguir.

 

Esta hipocrisia de sucesso inegável,

Da desleal astúcia com o reprovável,

Gera monstros insaciáveis e vorazes,

Sem barreiras nas ambições audazes.

 

Intelectuais acadêmicos mentalizam,

Possíveis eixos do mal e demonizam,

Tudo quanto é insubmisso ao desejo,

Dum voluntarioso poder de lampejo.

 

Encantam os monstros insaciáveis,

Para as tramas e lidas inexoráveis,

Que enlevam para acesso a poder,

E que deixa súditos a se escafeder.

 

As conspiratas e ilações golpistas,

Centralizadas nas visões ufanistas,

Veneram a anarquia estabelecida,

Para justificar mortes sem medida.

 

Não existe regra ética e nem moral,

E sequer respeito para golpe banal,

À suposta tarefa de defesa do país,

Já que importa só o que lhes condiz.

 

Se os supostos vigilantes da nação,

Tramam golpes de insubordinação,

O que sobra da invasão predadora,

Da sua mendaz ação dilapidadora?

<center>COLONIALIDADE</center>

  Este traço humano precípuo, Lídimo manifesto conspícuo, Revela na obsessão humana, Algo que choca e desengana.   Abrange modo ...