terça-feira, 5 de maio de 2015

Pelo amor de Deus



            É comum, quando a argumentação não consegue mudar um procedimento de alguém, que se apele à expressão “Pelo amor de Deus!”. Espera-se que este apelo mais forte produza uma reação favorável a algum interesse sobre uma ou mais pessoas. Do mesmo modo, podemos falar e insistir na afirmação de que Deus é amor. No entanto, o que se quer dizer, ao se insinuar que Deus é amor? Parece que, mais do que sentir-se interpelado para amar a Deus, deixa-se transparecer que se trata de uma assimilação intelectual com uma perspectiva conformista: quer-se que a outra pessoa aceite o discurso impetrado sobre ela. Na prática, isso não passa de tentativa de persuasão controladora.
            Quando o povo bíblico promulgou o primeiro e mais importante mandamento de “amar a Deus sobre todas as coisas”, tinha, certamente, em vista um sentimento de gratidão pelo que havia experimentado da parte de Deus, em seu processo de formação. Tinha sido iniciativa de Deus e não apenas um ato reflexo por persuasão humana. Por que Deus amou gratuitamente, o povo se sentia convidado a “amar a Deus”, como um gesto de retribuição, a fim de perpetrar esta sintonia de continuar captando seus sinais favoráveis a vida do povo.
            A partir do evento Jesus Cristo, a experiência religiosa dos seus seguidores passou a assimilá-lo como o mais explícito dom do amor de Deus. Quanto ao discipulado que ele convocou, implica em produzir sinais parecidos com os seus. Ao reconhecer este amor primeiro da parte de Deus, convém, pelo menos, uma correspondência para fazer, como Jesus, o que fez às pessoas que amava. E são tantas as narrativas edificantes relativas às formas como Jesus Cristo ajudou pessoas a recuperar o sentido da existência.
            O velho ditado de que “uma gota de mel atrai mais moscas do que um barril de vinagre” torna-se elucidativo para uma agir bondoso no meio das pessoas que se amam. Não convém que seja um processo de dominação através de afirmações categóricas meramente dirigidas aos outros.
            Não se trata tampouco de relação para o servilismo, tão ardentemente perpetrada por tantos discursos religiosos fundamentalistas, que apelam, até mesmo, à exploração emocional e aos recursos dos estados de transe para submeter pessoas aos seus interesses.
A interpelação de Jesus Cristo, para o seguimento, apontou o reino de Deus, ou seja, produzir frutos para que este reino possa expandir-se. Mais do que um peso, trata-se de participação positiva, a fim de inserir-se melhor no cosmos, constituído de pessoas, de animais, de natureza e das multifacetárias formas de vida.

            Facilmente o amor maior sucumbe a amores menores ou inferiores, movidos somente por interesses pessoais de privilégios, de vantagens, de status e, até mesmo, de interesses afetivos. Sobra, por conseguinte, um caminho longo para que a atenção humana e solidária às outras pessoas recupere um patamar mais elevado do que o da mera sedução com vistas a vantagens pessoais.

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