quinta-feira, 5 de junho de 2014

Linguagem e línguas



            Da herança do primeiro testamento da Bíblia veio uma re-significação de festa muito antiga. Antes mesmo da constituição do povo de Israel celebrava-se a festa de Pentecostes. Constituía uma das principais festas que levava todo o povo a festejar com alegria o início das colheitas.
Mais tarde este festa de Pentecostes transformou-se em romaria ao Templo para agradecer e expressar contentamento pelas primícias dos primeiros frutos colhidos na temporada. Tratava-se de uma festa de alegria que recriava muitas esperanças a partir da indicação que apontava reserva de alimentos para um longo ciclo de tempo até outra possível colheita.
            Com a experiência religiosa mais intensa do êxodo e da promulgação das regras ético-religiosas dos 10 mandamentos, esta festa de Pentecostes passou a fazer memória desta irrupção do bom espírito de Deus ocorrida no bom-senso das doze tribos para o entendimento.
            No início do tempo cristão, para os discípulos de Jesus Cristo, a grande transformação que aconteceu nas pessoas e nas comunidades levou-as a experimentar, na memória desta festa, como o bom Espírito de Deus, prometido por Jesus Cristo estava manifestando um auge na caminhada de sua fé. Tinha manifestado uma força transformadora profunda, pois, foi capaz de levar estas pessoas de fé a colocarem seus dotes pessoais ao serviço do bem comum.
A primeira experiência de medos, desencantos, e frustrações diante de falsas expectativas, estava totalmente relegada. A constatação objetiva lhes mostrava e inusitada forma de proceder. Estes cristãos passaram a anunciar e a testemunhar o Cristo vivo, para além das diferenças culturais e de expressão linguística, com alegria e bom humor, apesar das inerentes dificuldades.
            Este “querigma”, ou modo de testemunhar Jesus Cristo ultrapassava largamente todas as normais dificuldades para dialogar e anunciar o reino proposto por Jesus Cristo nos ambientes onde se falavam outras línguas. Em outras palavras, estes primeiros cristãos transformados, mostravam que a comunicação do amor, no jeito de Cristo, falava mais alto dos que os signos da linguagem das distintas línguas. A linguagem não verbal levava estes discípulos de Cristo a anunciar algo que encantava as pessoas. O jeito de Cristo tornava-se a fonte da irrupção do Espírito de Deus.
            Entre os discípulos e as comunidades cristãs não deixou de manifestar-se uma tentação forte de transformar dotes pessoais para uma ascensão pessoal, rápida e vistosa. Especialmente alguns dotes, como os de cura e de línguas eram as mais bem cotadas. São Paulo, no seu zelo pela integridade da mensagem salvífica de Cristo, alertava que os dotes pessoais sempre deveriam concorrer como serviço para o bem comum, a caridade, e não para uma auto-afirmação pessoal em vista de prestígio.
            Lamentavelmente nossos dias repetem a velha tentação de caminhos exotéricos, mágicos e sensacionalistas em torno de curas, línguas e libertações. Canso-me de ouvir pessoas que procuram ajuda pessoal e que declaram categoricamente que passaram por processo de cura e libertação, mas, na verdade, tornaram-se completamente embotados na fé, na alegria e na capacidade de testemunhar Jesus Cristo, a tal ponto que nem mesmo sexual e afetivamente funcionam. A lavagem cerebral deixou-as viradas em meros feixes de escrúpulos e de pesados sentimentos de culpa.
 A tentação dos extraordinários poderes terapêuticos tende a não passar de vulgar processo hipnótico e de produção de sons aleatórios que não representam língua nenhuma de culturas humanas. Aprender o mundo cultural e simbólico que subjaz à língua de um povo, é algo extremamente difícil e demorado. Por isso os presumidos poderes do milagre de falar muitas línguas sem longo tirocínio de estudos, pode indicar muito mais um caso de charlatanice do que de real e efetiva ação do Espírito Santo.


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