A festa da assunção de Maria ao céu, celebrada no próximo final de
semana, à parte dos aspectos polêmicos em torno do dogma, representa o grande e
profundo anseio dos discípulos de Jesus Cristo em nossos dias, para um dia
estarmos no céu através de um itinerário parecido com o de Maria.
O
evangelista Lucas soube fazer uma leitura muito interessante dos acontecimentos
que envolveram Jesus Cristo. Percebeu um indicativo da pedagogia de Deus, pois,
observou que nada das manifestações divinas passou por meio das clássicas
procedências de grandeza e poder. Para começar, Jesus não nasceu num palácio, nem
foi filho de rainha, e, o povo que conheceu sua mãe, não fora obrigado a
saudá-la com a expressão: “bendito seja o fruto do teu ventre!”, como era
obrigado a dizer diante das rainhas grávidas.
Ao fazer uma
retrospectiva do que envolveu Jesus Cristo, Lucas constatou que sua mãe fora
simples, humilde e serviçal. Mesmo grávida, foi prestar um serviço de ajuda à
sua prima, enfim, nada do que era importante nos escalões do poder humano.
Assim, Lucas também constatou que, já no Primeiro Testamento, Deus tinha dado
sinais da inversão dos poderes humanos. Agiu através de muitas mulheres para
mudar a cabeça obsessiva e destruidora de seus maridos. Nelas, toda a ação de
Deus se mostrara não de cima para baixo, de poder, de honra e grandeza, mas, de
pequenez, de humildes serviços e de gestos. Veio uma dedução muito importante:
as grandes coisas de Deus acontecem de baixo para cima!
Os sinais
mais fortes e evidentes da ação de Deus ao longo da história do povo hebreu
contaram com a mediação de mulheres como Rute, Ester, Mírian, Judite e tantas outras.
Maria aparecia no mesmo contexto de mulheres simples e serviçais para o bem
comum. Isto permitiu a Lucas selecionar as frases próprias do poder oficial e
invertê-las para referir-se a Maria, mãe de Jesus Cristo: observara que Deus
valeu-se de pessoas humildes para suas grandes obras. E é nesta perspectiva que
se pode entender o canto do Magnificat, um hino que canta o modo como Deus
subverteu a grandeza do poder humano. Seus gestos muito eloqüentes revelavam
que o triunfo final da vida é alcançado pelo caminho da humildade.
Longe das honras,
procissões vistosas e ornamentos requintados, tão facilmente identificáveis nas
imagens de Maria, o hino do Magnificat nos interpela ao itinerário de um caminho bem
distinto: não o da deusa poderosa, ornada com jóias, com coroa e tanta
manipulação pelo avesso do imagético das imagens de Maria, mas, pelo caminho
simples, discreto e atuante em favor do bem comum.
Que os
nossos anseios de assunção possam, no caminho de Maria, elevar-nos acima da
prepotência humana e das roupagens que traem as raízes da nossa fé!
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