Tanto na
interação com pessoas, quanto na experiência íntima do psiquismo, somos
constantemente afetados por ondas: por vezes são de entusiasmo, de
encantamento, de euforia, de gratuidade e de gratidão. Qualquer coisa pequena
que acontece, dá a impressão de que já vem aliar-se aos motivos de satisfação;
mas, também em muitos momentos da vida as ondas são de desânimo, de doenças, de
brigas e desencontros, de frustrações profundas e até de sensação de
incapacidade de lidar com as adversidades. Então, parece que uma onda
desagradável já vem emendada com outra ainda pior. Juntas, parecem engolir as minguadas
forças e até as motivações já cambaleantes.
A
experiência do profeta Elias nos oferece uma rica descrição a respeito de como
ele conseguiu integrar ondas de dificuldades numa crise de fé que chegou a
abalar a razão religiosa da sua existência. A descrição de como lidou com as
dificuldades nos oferece um lampejo de interpelação capaz de despertar o
entendimento das necessárias condições de espaço interior – que se fazem
necessárias - para que ali Deus possa ser experimentado.
Em nome de Deus o referido profeta havia se
dedicado intensamente ao combate a uma religião importada e que representava
uma ameaça à aliança firmada em torno dos dez mandamentos, importante código
ético moral à vida do povo hebreu.
Ao eliminar
os rivais, Elias esperava ser condecorado com algum privilégio e honras
especiais da parte de Deus. No entanto, a onda dos fantasiosos sonhos acabou em
pesadelo: Jezabel, a rainha que introduzira os sacerdotes de Baal com a
finalidade de substituir a religião centrada nos dez mandamentos, ao ver seus
sacerdotes derrotados por Elias, exigiu sua morte.
Elias conseguiu fugir em tempo. Mesmo
fora de perigo e já refugiado no Monte Horeb, entrou em crise profunda e chegou
a desejar a morte como melhor saída para livrar-se do desconforto pelo qual
passava.
O monte Horeb, mais do que refúgio, era lugar
simbólico, pois, ali Deus tinha inspirado Moisés a conduzir o povo. Elias esperava
ardentemente alguma intervenção especial de Deus, mas, sua experiência se
mostrava antagônica: nenhum sinal de Deus dentro dos tradicionais meios tidos
como os melhores para experimentá-lo.
Junto com a crise das buscas, veio,
enfim, uma experiência hierofânica de extraordinária síntese: ali não encontrou
sinais de um Deus que justificassem sua violência, simbolizados no vento, no
terremoto, no fogo, mas, apenas, no quase imperceptível murmulho causado pela
brisa suave.
A “brisa
suave” oferece uma imagem muito significativa: quando nos damos conta da
profunda incapacidade, e já não temos nada a dizer para ninguém, nem mesmo a
Deus, conseguimos criar algum espaço interior para admitir a escuta de Deus.
Mais do que expectativa de bajulação por parte de Deus, podemos constatar que
Ele nos aponta outro modo de ser e de lidar com a vida.
O ambiente
social facilmente nos leva a lutar e a pressupor que Deus tenha que nos ajudar
por meio de formas violentas para favorecer nossos interesses e, assim,
acabamos revelando que pretendemos ser mais fortes e insinuantes do que Ele. De
fato, sofremos muitas vezes para além da medida e nos decepcionamos até com
Deus porque Ele parece inoperante e insensível para nos atender. Entretanto,
como Elias, demoramos muito para chegar a perceber que não é no “ôba-ôba” dos
milagres e dos sinais mirabolantes, atribuídos a Deus, que nós realmente
criamos condições para que Ele possa nos apontar algo novo e peculiar, bem como
nos despertar novas estratégias para viver melhor.
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