Como a religião tem um vínculo muito
estreito com a cultura, facilmente se impregna de valores culturais nem sempre
os mais adequados aos princípios religiosos. A divisa entre religião e
ideologia muitas vezes não é clara, assim como não é clara a ação no espaço
religioso, pois, pode mover-se por interesse de auto-afirmação, de busca de
poder e até por mera aspiração de ascensão social.
Recordações antigas da Bíblia nos
mostram como num momento histórico da vida religiosa do povo de Israel se
falava como sendo atributo de Deus o que na verdade constituía desejo de
controlar as pessoas. Basta lembrar o texto do Êxodo, 20, 1-17: na valiosa
recordação do que Deus ajudou no passado, os possíveis líderes religiosos
passaram a fazer ameaças em nome deste Deus, movidos por um excessivo zelo: veicularam
a noção de que Deus é vingativo com os que o odeiam e sua ação se não atinge os
autores diretos, vai atingir filhos, netos e até bisnetos. Apesar desta
consideração, souberam reconhecer o lado extremamente misericordioso de Deus:
aos que guardam seus mandamentos e o amam, a misericórdia iria perpetuar-se até
a milésima geração.
Nos ensinamentos de Jesus Cristo
encontramos a reafirmação da misericórdia de Deus, sem limites, porém, sem as
ameaças de vingança. No modo de agir de Jesus Cristo, entretanto, transparece
profunda indignação com o desrespeito aos lugares de oração e de dignidade das
pessoas. No Evangelho de São João (2, 13-25) descreve-se como Jesus agiu no
templo, ao vê-lo transformado em lugar de negócios.
Estamos num momento histórico em que
não apenas os espaços religiosos centralizam os resultados econômicos, mas, até
se criou uma próspera indústria do comércio dos chamados “produtos religiosos”.
Se de um lado é importante expressar os sentimentos com imagens, ícones ou
referenciais simbólicos dos valores importantes da fé, isto, por outro lado,
pode deslocar o foco do que realmente é essencial ao âmbito religioso.
Quando tudo é transformado em produto de
vendas, até o “sagrado” vira mercadoria de boa venda. Ser religioso deve
implicar em muito mais do que mero consumo de objetos religiosos. E, mais do
que frequentar espaços religiosos, deve levar-nos a dignificar o valor de nós
mesmos, para aumentar a capacidade de respeito aos outros.
Ao lado da valorização dos templos
também somos interpelados a respeitar
profundamente o grande tempo do espaço que nos envolve, uma vez que, toda a
natureza, com seus ricos eco-sistemas, já é um extraordinário templo a ser
contemplado para encher a vida dos melhores sentimentos de riqueza desta alma
ampla da vida que transluz muito mais do que vingança e misericórdia, pois,
revela uma razão ao nosso existir e uma motivação para valorizar intensamente a
preciosidade do nosso corpo.
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