1 – A palavra
SINODALIDADE
Surgiu no contexto de 1950 como
movimento teológico de atualização e renovação (“aggiornamento”) no interior da
Igreja, contra o autoritarismo e o totalitarismo, tão marcantes nas duas
guerras mundiais. Foi um belo processo que culminou no Concílio Vaticano II.
Sínodo - Sýn (com) + Hodós (caminho) –
significa “caminhar juntos”. Os primeiros cristãos eram chamados de “discípulos
do caminho” (de Jesus), porque percorriam juntos o caminho de Jesus.
Sinodalidade, para nós, hoje, equivale ao convite à participação e comunhão em vista da missão (algo que é da raiz e da natureza da Igreja).
2 - Sinodalidade – desafio e novidade
O desafio do Papa para nós cristãos está num quadro um pouco diferente da
época do concílio Vaticano II: governar e fazer acontecer a missionariedade da
Igreja numa cultura democrática que está em profunda crise (globalização).
Nesta crise volta a tentação de um perigoso tradicionalismo católico e de um
jeito de governança autoritária.
Pouca gente
vê soluções na democracia e no autoritarismo. Sob este quadro, o apelo do Papa
Francisco é o de ampliar a experiência de sinodalidade
e colegialidade (tanto para governar, quanto para fazer acontecer a
proposta do Reino apresentada por Jesus Cristo), porque o grande perigo está na
governança de homens ditadores e fortes.
Sinodalidade é, por conseguinte, um caminho alternativo ao da governança autoritária, tecnocrática e clerical e, até mesmo para evitar o “positivismo papal” (de que é infalível e que manda sozinho).
3 – Sinodalidade – um
processo em andamento
Está
previsto para outubro de 2022 um Sínodo sobre a SINODALIDADE. Já está
acontecendo uma valiosa preparação, especialmente na Alemanha, Austrália e
Estados Unidos. Também estão aparecendo algumas dificuldades, como a do
isolamento devido a pandemia e a resistência de partes da Igreja (até mesmo no
Vaticano). Por exemplo, enquanto o Papa insiste na sinodalidade, a Congregação
emitiu, no mês de julho passado, a “Instrução sobre a Pastoral da Comunidade
Paroquial, e reafirmou o modelo tradicional do padre monocêntrico.
O alargamento da sinodalidade está aumentando a partir de algumas etapas: a) De 2013 a 2015: aconteceu o sínodo da Família e do casamento; b) Em 2016 ocorreu forte reação de tradicionalistas à Exortação AMORIS LAETITIA; c) Logo em seguida, em 2018, o Papa publicou a Constituição Apostólica Episcopalis Communio; d) Atualmente, aparecem alguns receios de que a sinodalidade seja encampada pelo clericalismo e passe a ser mera espécie de funcionalismo parlamentar.
4 – Ameaças a uma boa
sinodalidade
Um
primeiro risco é o do achatamento da Igreja, isto é, alguns ensinam e, todo o
resto, apenas escuta passivamente.
Outro risco
é o da má interpretação da sensibilidade e das intuições da fé cristã (SENSUS
FIDEI) a partir da noção do que uma pessoa pensa e faz; ou, do que um grupo fanático
e fechado vive, como sendo a Revelação, mas, sem a Sagrada Escritura e sem a
Tradição (apenas tradições mais recentes pouco vinculadas às origens).
Um terceiro risco é o de ajustar o modo de ser da Igreja com a atual cultura democrática em crise; e, nesta surge o encantamento pelo tradicionalismo que já foi muito negativo na Igreja antimoderna e antiliberal.
5 – Apostas do Papa
Francisco
- Promover
liderança sinodal e colegial ante o avanço de ditadores e homens fortes;
- Fazer
acontecer política de governança na Igreja que não tenha as marcas da
tecnocracia, autoritarismo e clericalismo;
- Ampliar a
capacidade de conciliação contra a tentação da comunhão fechada;
- Que a
sinodalidade, tão bem iniciada com o Concílio, dê, agora, um salto de qualidade,
com muitas energias e formas que ampliem o depósito da fé;
- Que a
sinodalidade, esta riqueza da eclesiologia do Vaticano II, aconteça não apenas
entre Bispos, mas, nos variados organismos de comunhão, nas Províncias
Eclesiásticas (Ex. aqui, em toda a Igreja do Estado do Paraná) e em todas as
conferências episcopais.
Resulta
disso a convocação para que a Igreja seja toda ela ministerial, através da
recuperação do sentido do batismo cristão; e, para que as atividades sejam de
serviço e não de poder. Mais do que ensinar doutrina, todos os membros da
Igreja precisam discernir e colocar-se na escuta da vontade de Deus para
perceber a sua vontade e as interpelações em favor de mais vida e mais
qualidade de vida.
6 – Implicações da
Sinodalidade
Que todos os
membros do Povo de Deus se sintam convidados à prática sinodal. Isso requer
“conversão do coração e do olhar” a fim de que a Igreja possa crescer num
estilo de lidas que, progressivamente, se aproxime mais do Evangelho e da
tarefa evangelizadora da Igreja.
Deste modo,
sinodalidade significa compromisso de tornar presente e operante o fermento, o
sal e a luz do Evangelho, na organização da vida do nosso tempo. Afinal, como
falar em “Povo de Deus” se ele é apenas passivo e segue à ordem de poucos
ministros, e, quando alguns destes resistem radicalmente ao grande apelo do
Papa?
A maior
dificuldade para uma atividade sinodal na Igreja vem do fato de que muitos dos
seus dirigentes, tanto leigos quanto clérigos, nunca aprenderam a conduzir seu
serviço de evangelização na dimensão da colegialidade e da sinodalidade. Vivem
a tentação de se aferrar no tradicionalismo (sob alegação de que sempre foi
assim para reafirmar seu poder).
Não dá para separar Sinodalidade e Colegialidade. Está em jogo uma visão de Igreja: ela deve abrir-se para a inclusão e todos os batizados são chamados a serem “discípulos missionários”.
7 – Ser Igreja na crise da democracia
Como a
sinodalidade atualiza as raízes do evento Jesus Cristo, não pode ficar inerte
ou inativa na crise da democracia. Neste momento histórico, a Igreja pode ser
altamente profética, começando com um novo modelo de governança, não de um
partido, mas de sinodalidade que rompe com o modelo político institucional de
cristandade da própria Igreja.
A crise da
democracia afeta muito o agir da Igreja católica sob diversos aspectos:
a)
Diminui
a participação política e os quadros políticos são ocupados por grupos
interesseiros e, com interferências estrangeiras (Ex.: Fake-News);
b)
Leva
à não participação na comunidade cristã;
c)
Também
as estruturas da Igreja vão se enfraquecendo e até muitos cristãos tomam rumos
contrários às finalidades das ordens religiosas, das associações e dos
movimentos. Assim surgem grupos independentes de todo tipo de gosto que não
somam com a Igreja;
d)
A
crise da confiança nas instituições afeta também as paróquias e dioceses: nem
sempre as decisões respeitam a dignidade batismal de todos os batizados. Assim,
a “água da governança na Igreja, anda bastante poluída” (leigos, padres, bispos
e até cardeais desrespeitam o Papa para justificar sua opinião ou seu interesse
pessoal).
e)
Tendências
fundamentalistas consideram como bom povo católico somente quem é fiel à
tradição, mas sem referência às fontes do Evangelho e das suas interpelações.
Sinodalidade deve ser um modo
católico de lidar com a crise atual de democracia (com muito partidarismo e
mínima capacidade de debate político a respeito do que é mais importante para o
povo).
Sinodalidade também implica em
discernimento para não controlar outros através de ordens categóricas. (Imaginem
se o Papa agisse como Trump ou tantos outros tiranos!).
Já tivemos um belíssimo exemplo de
sinodalidade: o Sínodo da Amazônia: mostrou uma Igreja missionária, participativa,
acolhedora e de harmonização das diferenças. Ali foi reconhecido o lugar dos fiéis
nas decisões e na governança.
Enfim, não se trata de pensar Igreja
democrática tipo parlamento, nem de Igreja monárquica, mas, de Igreja de
Comunhão.
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